Nas cerca de duas horas em que estive no Largo de São Domingos perguntaram-me se era ali que a Câmara ia acender 40mil velas pelos judeus mortos e se era ali que se ia inaugurar o monumento ao judeu de Lisboa… Depois perguntaram-me também, em várias línguas, o que se celebrava ali. Estavam menos de 20 pessoas em volta de uma Oliveira enfeitada com velas entre as raízes e ainda assim (talvez por isso) as pessoas que passavam aproximavam-se e perguntavam… O que é?
Falei com uma simpática beata da Igreja Católica (plena de contradições que me escuso documentar) que desconhecia este episódio da história daquele lugar, falei com uma turísta que repetiu a viagem e o inquérito para saber exactamente o que se comemorava, falei com outro casal que ficou admirado pela distância (500 anos) face ao evento. Mas a noite, além da companhia dos que por ali partilharam com saudável cumplicidade a humilde homenagem (com cerca de 80 velas que ficaram ardendo encostadas ao aconchego da parede do edifício fronteiro à Igreja), trouxe ainda uma longa conversa que eu e a Cláudia tivemos com um curioso e simpático casal caravanista alemão (de Munique/Lago Constança). As perguntas que o homem fez fizeram-me lembrar muito as tuas Lutz: as perguntas dele aos pais enquanto jovem (era homem para estar nos 40) para tentar comprender a história recente da Alemanha, a curiosidade quanto à forma como os portugueses encaram uma memória destas com 500 anos e porque o fazem. E ainda a surpresa por se tratar de uma homenagem pública pioneira e não um hábito antigo… Acabámos falando do encanto pelas viagens, do futebol e da surpresa muito agradável que parecia estar a ser a cidade de Lisboa para eles… e se calhar um bocadinho para nós também.
No final da noite chegou a cacimba, amainou o vento que insistia em apagar as velas e ficaram três zeloso polícias, a ver-nos virar a esquina. Sim: a homenagem, a lembrança. E mais nada? Eles perguntaram, houve mais qualquer coisa. E ainda bem que assim foi.
Não foram 4 mil velas (lá) Nuno, mas valeu bem a pena.
Adenda: referência na Sic a que cheguei pela Lua.
Adenda II: referência hoje na capa (fotografia) e página 13 do Público (Maria José Oliveira) e página 22 no Diário de Notícias (Fernanda Câncio)