Ouvindo hoje várias entrevistas do Cardeal patriarca português consegui completar uma síntese que havia perdido há algum tempo. A questão da união entre pessoas do mesmo sexo é uma singularidade para a qual a Igreja não tem compreensão possível, no máximo, a inevitável tolerância. E digo inevitável porque a Igreja de hoje não pratica a barbárie que promoveu no passado. Digo também inevitável porque a incompreensão se fundamenta na lei natural, uma lei que garante à união entre homem e mulher o exclusivo da capacidade para gerarem uma relação de amor completo. As outras opções toleram-se, mas não se compreendem pois estão fundamentalmente erradas.
Já em tempos disse que atribuir o carácter opcional a quem é gay (“só o é porque quer”) é o mesmo que dizer a um canhoto que este é livre de deixar de o ser (“os canhotos só o são porque querem”) e é neste paralelo bem distante do silogismo que todo o castelo lógico da Igreja, nesta matéria, se esboroa. A própria ciência tem vindo progressivamente, e assim que se libertou de alguns entraves e preconceitos morais e religiosos, a estudar e a procurar encontrar as eventuais múltiplas justificações para a existência de comportamentos gay entre inúmeras espécies animais. Do mesmo modo que se procuram explicações para a minoria dos ruivos, dos que têm olhos azuis, dos que são canhotos. Até daqueles aparentemente doentes e deficientes, portadores de uma anemia crónica hereditária que num belo dia, perante o alastramento da malária se revelaram completamente imunes e perfeitamente preparados para enfrentar as circunstâncias. A ciência não é amoral, mas detesta preconceitos. Por muito que (ainda) pareça óbvia a tal lei natural, até esta pode ver os seus fundamentos minados e não dependerá apenas de quão lato for o nosso conceito de natureza (admitindo ou recusando manobras da ciência mais instrumental, com inseminações e quejandos), poderá tão somente bastar um qualquer Galileu, com as lentes no sítio.
Para mim, nem disso preciso, num bom exemplar da bíblia qualquer potencial incompreensão Saramaguiana perante aparentes contradições, é batida aos pontos pelo fundamental da mensagem de Cristo. Não há nenhum asterisco em “Amai-vos uns aos outros”. É ele, o amor, que na dúvida será sempre a nossa salvação e o nosso guia.
Felizmente, há quem tenha compreendido esse capital fundamental que o cristianismo pode oferecer como mais valia face a algumas outras religiões. Não será ainda (e talvez nunca inteiramente) o caso da Igreja Católica Apostólica Romana. Como é Rui? Poderás ser católico ainda assim? Uma pergunta, que bem vistas as coisas, é absolutamente irrelevante.
8 replies on “Galileu nunca chegou ao céu”
Sendo eu completa e radicalmente exterior à Santa Madre Igreja, a qual trabalha num registo que me é estranho, nada posso comentar sobre o cerne do texto. Mas permite-me uma opinião: não há, não houve e não haverá nos próximos longos milénios, “comportamentos gay” no mundo animal. Isto de dissecar “ideologias” “más” e aceitarmos (e até propormos) a naturalidade (donde “bondade”) de outras já enjoa. O “gayismo” é um movimento político-ideológico, coisa que o mundo animal desconhece. O futuro da evolução pertence (a Deus Nosso Senhor?) ao que pertence e talvez um dia isso venha a acontecer. Por enquanto não.
Parece-me que o problea é etimológico… Eu não pus “ismo” em lado nenhum.
Haver homens a fazer sexo com homens e mulheres a fazer sexo com mulheres e, de caminho apaixonarem-se e tal é coisa do movimento pólítico-ideológico referido, ou seja, coisa para ter, uns anitos, umas decadazitas? E, portanto, resultado de uma ideologia a que se pode ou não aderir?
A prática de sexo continuado e recorrente entre especimens do mesmo sexo é um exclusivo dos Homens (espécie) e, concretamente, do que são filiados no movimento político-ideológico referido?
Se respirar é uma ideologia, eu sou militante. AInda que admita haver entre os meus camaradas quem respire pelo nariz, outros pelo boca e outros ainda de ambas as formas, sem que a diferença seja necessariamente uma opção de cada um. Há com cada sinusite…
o “ismo” fui que o pus. Porque tu não o puseste, assumindo a naturalidade do “gay”. O que há no mundo animal é comportamente homossexual. Gay (já agora um anglicismo) é um termo identitário, ideológico, assumido por um movimento – há quem queira ver nisto uma ofensa, não o uso como tal (aliás, a língua está cheia de ofensas para os homossexuais, não é preciso o inglês para isso).
Ou seja, não é uma questão etimológica, é uma questão ideológica. Ou melhor, política.
Que passa pela interpretação do real e pelas imputações – vê lá bem o teu texto. Nada percebo de teologia, nada percebo da gigantesca hermenêutica bíblica. Mas iria jurar (por Deus Nosso Senhor) que estás a manipular, para bem do teu argumento, a palavra conceito “amor”. É isso impeditivo que fora da igreja se estenda (ou entenda diferentemente) o termo “amor”? Não, até miuto pelo contrário (diz este ateu). Mas é uma tropelia (ideológica, talvez fruto da adesão ao “gayismo”) manipular – dar-lhe um sentido diverso – e exigir que outros que o manipulam de outra forma o façam como “nós”.
desculpa lá invadir-te a caixa de comentários à noite com este desabafo não-ideológico. Olha, vai dedicado aquele pobre e parvo evangelista que foi preso em inglaterra por pregar na rua (speaker’s corner) que a homossexualidade (ou seriam os sodomitas?) é pecado.
Não sei se estes fazem parte do movimento mas tiveram uma iniciativa interessante ao abrirem o debate: http://news.nationalgeographic.com/news/2004/07/0722_040722_gayanimal_2.html
Longe de mim ser teólogo mas creio que é evidente que o amor de Tomás de Aquino é bem diferente do que havia antes dele e outros dentro da Igreja o discutiram e discutem.
Com jeitinho é fácil encontrar membros do clero que apresentam limites bem distintos ao amor que definem. Parece-me mais ou menos evidente que há um incómodo pluralismo (incómodo para alguns, entenda-se) quando se abre a porta à discussão dos limites da aplicabilidade e de reconhecimento do amor.
Enfim, por vezes ocorrem até dissensões, surgem novas igrejas. There is a war como dizia o Cohen.
A Igreja lá se vai “purificando” mas ainda não perdeu a energia vital de questionar e de interpretar a palavra de Deus. O cristal que alguns apresentam como definitivo e original é apenas mais uma versão, aquilo que se espera um melhor entendimento. Ora se isto assim é, aceitar participar na discussão que nos entra pela vida a dentro é manipular?
Eis o que ofereço:
O que é o amor para os católicos afinal?
Perfeitamente de acordo, “supra-plural” a história da Igreja, e nessa pluralidade uma hierarquia que, sendo hierática e tendencialmente conservadora, é e foi muito plural. Por isso mesmo, e também daí o meu comentário acima, me parecer anacrónico querer fixar um conceito de algo, “amor” neste caso, e convocar/invectivar a igreja face a esse (nosso) conteúdo.
O link que deixas verei depois, à noite. Atrevo-me a deixar-te uma referência de um livro que li há pouco, uma maravilha, “Quand notre monde est devenu chrétien” de Paul Veyne, a emergência do cristianismo e a sua expansão – muito assente numa nova concepção de “amor”, extensa e polissémica como antes nunca. [Não digo que “resolva” algo, mas é uma leitura laica apaixonante]
Abraço
(e viva o Rio Ave)
Parece-me que o problea é etimológico… Eu não pus “ismo” em lado nenhum.
Haver homens a fazer sexo com homens e mulheres a fazer sexo com mulheres e, de caminho apaixonarem-se e tal é coisa do movimento pólítico-ideológico referido, ou seja, coisa para ter, uns anitos, umas decadazitas? E, portanto, resultado de uma ideologia a que se pode ou não aderir?
A prática de sexo continuado e recorrente entre especimens do mesmo sexo é um exclusivo dos Homens (espécie) e, concretamente, do que são filiados no movimento político-ideológico referido?
Se respirar é uma ideologia, eu sou militante. AInda que admita haver entre os meus camaradas quem respire pelo nariz, outros pelo boca e outros ainda de ambas as formas, sem que a diferença seja necessariamente uma opção de cada um. Há com cada sinusite…
o “ismo” fui que o pus. Porque tu não o puseste, assumindo a naturalidade do “gay”. O que há no mundo animal é comportamente homossexual. Gay (já agora um anglicismo) é um termo identitário, ideológico, assumido por um movimento – há quem queira ver nisto uma ofensa, não o uso como tal (aliás, a língua está cheia de ofensas para os homossexuais, não é preciso o inglês para isso).
Ou seja, não é uma questão etimológica, é uma questão ideológica. Ou melhor, política.
Que passa pela interpretação do real e pelas imputações – vê lá bem o teu texto. Nada percebo de teologia, nada percebo da gigantesca hermenêutica bíblica. Mas iria jurar (por Deus Nosso Senhor) que estás a manipular, para bem do teu argumento, a palavra conceito “amor”. É isso impeditivo que fora da igreja se estenda (ou entenda diferentemente) o termo “amor”? Não, até miuto pelo contrário (diz este ateu). Mas é uma tropelia (ideológica, talvez fruto da adesão ao “gayismo”) manipular – dar-lhe um sentido diverso – e exigir que outros que o manipulam de outra forma o façam como “nós”.
desculpa lá invadir-te a caixa de comentários à noite com este desabafo não-ideológico. Olha, vai dedicado aquele pobre e parvo evangelista que foi preso em inglaterra por pregar na rua (speaker’s corner) que a homossexualidade (ou seriam os sodomitas?) é pecado.