Quanto mais os partidos, por via dos seus lideres, apregoam que vão apostar na renovação de ideias, pessoas, organização mais me parece evidente que estamos perante um distúrbio organizativo/mental qualquer. Dizer que se vai fazer como tentativa de autoconvencimento para se fazer, nem sempre é o melhor método. Fica apenas o marketing político de ocasião.
Na alternativa ao bloco central, de que alguns se recordarão, na primeira semana houve 50 bloggers e seus amigos que se inscreveram no grupo de discussão. A esmagadora maioria nunca abriu o pio e eu, tendo financiado o processo (pagando o blogue para multi-editor) e tentado dinamiza-lo no primeiro momento (sem monopolizar), cedo confirmei as minhas fracas expectativas sobre o projecto. Foi uma brincadeira que dependendo daquelas 50 pessoas e das suas vontades era formada essencialmente por quem queria que alguém se responsabilizasse por uma liderança, um auto-proclamado e muito sabedor líder, provavelmente. Pouco se conseguiu construir em grupo que perdurasse por este meio. “Sociologicamente” a falta de tempo matou o projecto; foram vários os dinamizadores que alegaram justamente esse aspecto para que a coisa caísse de podre sem ter começado. A nossa vidinha laboral não se compadece com o ritmo político e suas exigências. Fazer política não pertence às principais prioridades de quem tem de trabalhar para sustentar uma família. Julgo não errar muito que hoje, fazer política sem um fito puramente egoísta é uma actividade para a qual estamos indisponíveis.
Vem esta conversa a propósito do grito de alma do Carlos Castro no Tugir, inspirado pelos últimos desenvolvimentos sobre as eleições presidenciais que aqui quero publicamente subscrever e promover. Das suas palavras (“os partidos políticos portugueses não têm quadros políticos.”) ressalta uma necessidade: precisamos fazer dos partidos centros de competência para a governação do Estado. E para aqui chegarmos temos de combater o caciquismo, a ignorância, os estrangulamentos institucionais que servem de tampão à própria lógica democrática no seio partidário. Temos que ter coragem para dar coerência à organização de todos os servidores do Estado, precisamos tornar cristalino o financiamento partidário (quantos caciques não perderiam o seu elan?) e precisamos construir um regime condigno, socialmente justo e eficaz de atracção, remuneração e consagração dos políticos no activo e seus partidos.
Não foi por acaso que o primeiro tema que tentei debater na Alternativa ao Bloco Central foi o do financiamento e organização do sistema partidário e não foi com surpresa que as reacções que obtive dos outros participantes apontavam o carácter quase esotérico e pouco realista face às prioridades da vida mundana que atribuíram ao tema da discussão. Continuo a achar que essa discussão é basilar a qualquer processo de dignificação e refundação de qualquer partido. Talvez em tempo de crise económica seja particularmente difícil dar a esse tema relevância e encontrar para ele alguma resolução. Mas, de uma forma algo enviesada, julgo que ele nos rebenta na cara quando vemos a forma politicamente oca e fragilizada com que chegaram ao poder os actuais lideres dos dois maiores partidos portugueses (clara nas suas pouco mais que ocas ideias e inspiração e no seu mais que evidente objectivo primordial de ganhar as próxima eleições a todo o custo – veja-se a composição de listas para algumas câmaras).
Rebenta-nos na cara também quando lemos um texto como o do Carlos e não podemos deixar de reconhecer como aponta de forma apurada o principal risco de falência para o nosso sistema democrático. Os actuais partidos são incapazes de dar conta do recado que lhes foi atribuído pela Constituição. O ridículo de Cavaco e o milagre de São Soares a José Sócrates são disso exemplo cristalino.
Serão eles exemplo dos últimos políticos que restam sobre o solo lusitano?
Como resolver a coisa?
Acima de tudo é fundamental contribuir para o processo de mudança com aquilo com que melhor somos dotados. No mínimo estar à escuta, com espírito crítico, em busca de novas práticas, fazer isso é criar chão para boa sementeira. Haverá quem nos venha oferecer boas e más sementes nos próximos anos, saibamos onde enterrar a nossa enxada.
O empreendedorismo que nos falta ao nível empresarial, parece também evidente ao nível político, com a agravante de que, nos dias que correm, ir para a política oferece-nos de entrada um “emerdamento” automático e quase inelutável. Dediquemo-nos ao trigo e ao joio que não há outro remédio melhor. Sobre a inevitabilidade deste rumo temos as lições da nossa trágica história de aventureirismos ditatoriais como referência.
6 replies on “Tugir em Português II”
Li atentamente este post e sinceramente cabe-me
penitenciar por não ter assumido como participante
embora não muito assíduo no projecto que lançou
e como me competia deveria ter-lhe solicitado a
informação sobre a parte que me caberia em termos de contribuição, face aos custos que o projecto lhe acarretou, quando afinal tratou-se duma ideia que vários de nós apadrinhamos e acabamos por não assumir. Julgo no entanto estar a tempo de me poder redimir dessa falta, caso esteja disposto a informar-me da minha quota parte neste projecto ao qual dei desde a primeira hora o meu apoio.
A despesa está há muito amortizada e na minha modesta opinião o Raul fez parte da excepção activa no Alternativa. de qualquer forma agradeço-lhe a disponibilidade.
Apenas referi a questão $$ para sublinhar que todas as iniciativas têm custos e necessidades dessa natureza que convém não ignorar, mesmo numa tentativa de conversa alargada como foi o Alternativa. Quanto mais ambiciosa for iniciativa (e provavelmente maiores as nossas expectativas sobre ela) mais relvante será a restrição financeira podendo vir a revelar-se uma limitação importante. Como responder a essa necessidade quando estamos a preparar alternativas de poder no seio de um partido não é uma questão que se possa ignorar. É um assunto melindroso que deve ser encarado por todos muito seriamente, sob pena de nunca sabermos exactamente que tipo de interesses estamos a alimentar ou a deixar que controlem o país.
Uma última palavra, no alternativa não foi claramente a restrição financeira que fez o “movimento” perder a chama, não concorda? Foi morrendo e apagou-se.
È o activismo de rato e teclado, como te disse no outro dia, tudo o que obrigue a levantar da cadeira e a fazer coisas no mundo off-line já vai esmoreçer o suposto entusiasmo das pessoas. Ah e se não meter almoço para se contar umas larachas também está condenado à partida.
Já tive a minha quota parte de actividade nessas lutas para saber o que vai acontecer, e já não alimento qualquer tipo de expectativas sobre o assunto.
Gostei de ler este seu post.
Voltei às lides da escrita e, como não podia deixar de ser, vim fazer-lhe uma visita. Parece-me que está vendo a política por um prisma que torna a imagem mais clara e, conforme o tempo passa, se as coisas assim continuarem, o seu prisma tornará mais nítida a figura que o Rui observará.
Mas, se as coisas assim continuarem, não sei qual será o desfecho. Se a nossa moeda fosse o escudo, dir-lhe-ia que uma ditadura se avizinhava como um furacão.
Assim, não sei o que pode acontecer.
É com muito gosto que o releio no seu ensaio Manuel e que recebo a sua visita por aqui.
Espero que tenha razão quanto à interpretação que faz das minhas palavras no que toca à capacidade de identificar a situação, quanto ao desfecho também não sei qual será mas, bem vistas as coisas, não é essa incerteza que nos deixa perdidos: só há um caminho que é o de tentar contribuir para um país e uma vida melhor. Não sei bem é como…
O discurso que me atrevo a chamar reinante que não tem chegado aos media e que se ouve por alguns recantos populares deste país chega a ser assustador, isso é inegável.
É indispensável e o país o exige, assim creio, que os jovens lutem para que os ouvidos moucos dos i-responsáveis pelos destinos de Portugal, comunicação social, políticos e os seus partidos, ouçam aquilo que o povo clama e que os jovens quadros activos, independentes e com sentido da responsabilidade, vêm “gritando” àcerca da terra que é de todos nós e não só de alguns que nada fazem por ela.
Continue com forças e não largue a “pena”. Eu também quero ajudar.