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Para sempre

Contra a mediocridade: resistir, resistir.

Se te ataca a vaidade: fugir, fugir.

Se queres liberdade: florir, florir.

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Opinião: Uma carta, a pretexto dos parabéns ao PS

 

 

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Querido leitor,

Tenho 37 anos, sou filho de migrantes, nascido em Lisboa, criado entre o subúrbio sintrense e a raia de Espanha, lisboeta em permanência vai para 10 anos. A pretexto dos 40 anos do PS ocorreu-me discorrer sobre a minha memória da política que se confunde com o tempo de vida. E tu, caro leitor, onde estiveste nos últimos 40 anos?

As primeiras memórias que tenho da política construíram-se pela televisão, a campanha presidencial de 1980, a morte do Primeiro-Ministro, a eleição de Ramalho Eanes… E pela rua nos vários 25 de abril e festa associada. Recordo a história do 25 de abril contada pelo meu pai, beirão, ex-guardador de rebanhos, à data marinheiro de prevenção na capital, sem excessiva carga política ou entendimento de tramoias complicadas. Um genuíno e singelo amante da liberdade e da justiça.

Depois, veio a atenção aos debates na TV, Mário Soares, o fascínio pelo que era o entendimento e o desentendimento em política, a AD, o Bloco central, as várias pétalas da rosa socialista no PS, os senhores eternamente zangados do PCP, o táxi do CDS, a convulsão do PSD.

Recordo já melhor o turbilhão na segunda metade da década de 80: a era moderna da política lusa com a entrada na CEE, com o primeiro presidente civil, a primeira grande vitória política com que vibrei verdadeiramente no que uns 11 anos permitem. O fenómeno PRD, a ascensão de Cavaco e os “mestrados em política e jornalismo” com o nascimento da TSF. O desenvolvimento do sentido de justiça, em crescendo. O querer sempre defender os mais fracos, de preferência com a palavra. O soco dado e recebido, num extremo. O querer compreender, o gostar de matemática e chegar à economia começando a criticar a lógica monolítica da política económica cavaquista. Acompanhar a JS de Seguro, um tipo de uma família decente lá do concelho, à distância…

E mais instantâneos e reflexões, como o medo de perder a capacidade crítica com uma entrada precoce num “clube” político. A faculdade, uma maior participação política, a felicidade de fazer amigos politicamente muito diferentes e bons democratas. Caminhando sempre próximo do PS, em choque com a degradante praxis política nas juventudes em batalha pelas associações de estudantes. E a perceção do acerto na aposta de um afastamento consciente da política partidária organizada. A consciência de que vibraria demasiado com o “clubismo”; o Sporting a ensinar-me que precisava de mais defesas para não perder o norte. O respeito pela família com a necessidade de acabar o curso em 4 anos. As manifestações contra Cavaco, na rua. As visitas aos antiquários de São Bento sob patrocínio policial.

As várias camadas da política mediática, a política pelos jornais, do Independente ao Expresso mas sempre a minha amada rádio. A sensação de algumas oportunidades perdidas na gestão do país, a perceção de Guterres como a última grande oportunidade para fazer grandes coisas e depressa com a generosa boleia da CEE.  A dignidade, o diálogo, uma maior sinceridade e transparência na forma de fazer política. A importância da forma sobre o conteúdo. A admiração / desconfiança perante as agências de comunicação. A política espetáculo e o espetáculo da política. A surpresa civilizacional dos autóctones sobre sí próprios com a Expo 98. A vertigem para o vazio. A morte de Cunhal, a sucessão de Soares. Jorge Sampaio. Algures por aqui, começar a compor uma nova família. O cumprir serviço publico como trabalhador do Estado.

Foi também tempo de perceber a imensa dificuldade que há entre o querer e o fazer. A crescente dissonância entre o político, o povo e o interior do país. A sucessão de desiludidos da política da minha idade que foram mais para dentro do que eu e que se afastaram, à esquerda e à direita, co mraras exceções. Alguma desilusão com o PS, com o aquém de Guterres. Admiração por Ferro Rodrigues e pela capacidade de reinvenção do PS. O melhor e o pior do PS com o caso Casa Pia. A revolta perante tiques possessivos face ao país, às instituições e à democracia. A hipocrisia e o cinismo de Barroso, o que deu à sola. A degradação política dos meios e da prática de Santana Lopes. A esperança e o entusiamos com Sócrates.

O arranque reformador do PS com maioria absoluta. O político profissional. A constatação dos tiques dos pequenos poderes na administração do Estado com patrocínio partidário, sem grande diferença face ao governo do momento. Um mal social banalizado. A capacidade de reformar com nexo e concertação na Segurança Social e no Trabalho. A admiração por Vieira da Silva. O cutucar da vaca sagrada na educação, sem grande inteligência emocional. O ensino obrigatório até ao 12º ano, a boa ideia do Magalhães, a falta de procedimentos credíveis/estabilizados de sindicância de investimentos. A realpolitik à moda lusa. A capacidade de renovar, de cativar novos quadros para o exercício do poder. O plano tecnológico, as renováveis, o simplex, a lei em português claro, a e-governo com alguns excessos de velocidade, a coragem de assumir que era preciso mudar nos direitos cívicos, nas liberdades individuais.

O excesso de imagem, os sinais de obstinação, a incapacidade de compreender as ameaças latentes. A necessidade imperiosa de termos um governo melhor do que o país. A infantilização do eleitor. Não perceber onde ficou a defesa do interesse nacional perante opções simbólicas eleitoralistas. O encurralamento autoinduzido numa realidade virtual, a sucessão de mentiras, a excessiva pressão política sobre serviços públicos independentes, o fracasso político e orçamental em 2010. Mas também a traição vinda da Europa.

O MEP e finalmente a militância. Fazer duas campanhas na estrada, em dedicação exclusiva. Construir uma alternativa de raiz. A perceção de que não há ameaça bastante para motivar a renovação e a aproximação aos interesses de muitos portugueses dentro dos partidos acomodados. A descoberta de que há muitas pessoas competentes e politicamente mobilizáveis para a causa pública ativa dentro de estratos pouco comuns (jovens adultos com família, vida estabelecida e sem experiência política ativa anterior). O corte com o MEP às mãos da fábula da escorpião.

A pesada herança emocional de Sócrates. A fraca crítica interna com reflexo externo claro do passado recente. O ciclo de vida política de Seguro, o falso-lento. A pouca densidade política de Seguro em virtude da reduzida afirmação política prévia em matérias de políticas de Estado mas também a convicção da honestidade e do genuíno interesse na defesa da causa pública. As dúvidas quanto à capacidade de evitar um permanente ambiente de guerrilha e acerto de contas interno. O perigo de um racalcamento mas trabalhado. E depois a redução da perceção da ameaça e a concentração no essencial. O apelo à participação. O aceitar do desafio. A compreensão da imensidão do desafio político do momento. A catástrofe governativa. A necessidade imperiosa de uma alternativa. A imensa desconfiança na política. Os fumos do final de regime. A militância no PS, sem reservas, por fim.

E, claro, a internet, pretexto para novas amizades, para a exposição egocêntrica e narcisista, para o desabafo, para o debate, para a política, para a aprendizagem, até para o amor.

Caro leitor, mal te conheço, serás pessimista-otimista, preguiçoso-trabalhador, ativista-comodista ou mesmo teimoso errante, sei que enquanto me leste fomos um único português. Tem de ser por aí…

Mando-te os meus parabéns, ao PS.

Ao dispor,

Rui

Também públicado no 365 Forte.

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Opinião: Para quê este teatro?

Expliquem-me lá qual é o cabimento, o sentido, a utilidade de se convidar o maior partido da oposição para “o tentar chamar à razão” perante os belos resultados da política implementada ao longo dos últimos anos?

Depois de meses a menosprezar o PS e a impôr, com particular afinco, um programa de austeridade powered by Gaspar, que culiminou com o PS a apresentar uma moção de censura ao governo, o que é que hoje foi apresentado para emendar a mão e encontrar alguma forma de refazer um caminho com um mínimo de consenso? Segundo o PS, nada.

Para este teatro, de facto, dispensavam-nos o espetáculo.

Também publicado no 365 Forte.

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Diagnósticos há muitos: eis mais um.

“(…) Sem cuidar de julgar com particular detalhe a bondade das premissas creio serem estas algumas notas fundamentais da conjuntura política que temos de encarar para perceber a história recente, os bloqueios, os desafios e os caminhos do futuro do arranjo político e da governação em Portugal. (…) O PS (…) A governação (…)” em 8 pontos no 365 forte: “E amanhã? Notas soltas sobre o diagnóstico político“.

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Opinião: E amanhã? Notas soltas sobre o diagnóstico político

O discurso e rumo político quase hegemónico em termos de exposição pública, patrocinado pelo atual governo local e externo que nos rege, tem alimentado um espírito fatalista em que somos profissionais e tem contribuído para impor níveis de ansiedade e um quase “monolitismo do desespero” em qualquer esforço de antecipação de uma alternativa do futuro.

Sem cuidar de julgar com particular detalhe a bondade das premissas creio serem estas algumas notas fundamentais da conjuntura política que temos de encarar para perceber a história recente, os bloqueios, os desafios e os caminhos do futuro do arranjo político e da governação em Portugal.

O PS: 

 

1)      O governo anterior cometeu excessos e falhou em momentos críticos. Em particular algumas opções tomadas após o dealbar da crise internacional, reveladoras de uma fraca capacidade de antecipação da dimensão do problema que se adivinhava. Destaca-se a falha muito expressiva na execução orçamental em 2010 aliada à imagem de revisões sucessivas de projeção da realidade tão convictamente negada em curtos espaços de tempo que se sucederam com a rápida degradação das condições de financiamento externo nos últimos anos da governação.
No final, ficou uma pesada herança política para gerir que se consubstanciou numa igualmente pesada derrota eleitoral e na necessidade de um exercício onde a recredibilização do PS enquanto alternativa política de governo que se adivinhava, à altura das últimas eleições, de muito difícil e moroso alcance;

2)      É um clássico em todos os partidos que foram governo e que tiveram condições para fazer obra: o dia seguinte pode ser muito complicado. No caso do PS não foi diferente. Com a saída de uma figura de proa carismática, vencedor da primeira maioria absoluta à esquerda, extremamente competente no combate político mediático e que levou a um patamar diferente do habitual no PS a dimensão do culto da personalidade, o anticlímax de uma das mais pesadas derrotas eleitorais da história do PS era inevitável. O recém-empossado líder cedo teve de enfrentar oposição interna e pública centrada no ataque à forma (por inevitável comparação com o líder anterior), na exigência da defesa da herança passada (que não foi ainda verdadeiramente escrutinada internamente) e na crítica aos procedimentos de gestão da imagem pública do partido (errância e fragilidade oratória dos porta-vozes) e da organização interna, amiúde promotores de um ambiente de guerrilha que tinha no grupo parlamentar um dos focos e no novo poder das estruturas regionais e nacionais do partido outro. Como disse, nada de verdadeiramente novo na história democrática do país. Nova, de facto, só a gravidade da conjuntura envolvente;

3)      Com o entendimento de Coimbra, a energia vital da atual direção, até ali acossada e reativa – nem sempre da forma mais feliz – pode ser canalizada para a ação política mais orientada para a construção de uma alternativa para o país. A perspetiva de uma união de competências (um recurso sempre escasso em qualquer organização), patrocinada por uma melhor clarificação da interpretação do passado e das propostas para o futuro permanecem o principal e decisivo desafio para a definitiva credibilização do PS enquanto alternativa política.
Um trabalho que parece estar em curso ainda que claramente necessitado de uma salto qualitativo e de consolidação. Uma tarefa que, reconheça-se, quer pelas circunstâncias habituais do ciclo político, quer pelas circunstâncias muito peculiares do enquadramento económico nacional e da desastrosa governação em curso ganha contornos de dificuldade e urgência inusitados.

A governação:

4)      Diabolizar o governo anterior e o despesismo crónico do PS, imputando-lhe responsabilidades que vão bem para além do seu papel histórico, aproveitando para capitalizar a forte descredibilização que existia em torno do último governo do PS – recorde-se que o anterior Primeiro-Ministro era amiúde retratado como Pinóquio, à esquerda e à direita – foram e são um dos baluartes do condicionamento político ao PS alimentado pela atual maioria;

5)      O discurso da maioria tem evoluído em clarificação no sentido da uma segunda diabolização: a do Estado, num espírito de missão onde se afirmou distintivamente como querendo “ir além da troika” – a política de austeridade do “custe o que custar”. O único objetivo da governação digno desse nome tem sido o de reduzir acriticamente e depressa , testando e ultrapassando os limites da lei fundamental, os recursos sobre os quais o Estado tem algum tipo de intervenção;

6)      A realidade económica, volvidos cerca de 4/5 anos de progressiva e continuada austeridade oferece muito poucos sinais de evolução positiva e nenhum que garanta comprovada sustentabilidade no futuro. O fracasso é total, estando a economia nacional em progressiva desagregação que ocorre em simultâneo com uma diminuição da identificação do eleitorado com a constelação político-partidária existente.

7)      O contexto europeu degradou-se igualmente ao longo dos últimos anos, tornando-se cada vez mais visível a estrita defesa dos interesses nacionais de curtíssimo prazo entre os parceiros europeus e uma total incapacidade de reação e acomodação de recomendações avisadas de atores políticos e económicos internos e externos à União Europeia. Tudo o que de fundamental que tem sido identificado para garantir a integridade e futuro do projeto europeu e, em particular da zona euro, tem sido ignorando ou, quando muito, aceite como desígnio a implementar em futuro incerto e distante, de forma totalmente inconsequente ou mesmo contraproducente para o momento atual.

8)      A impreparação técnica e a falta de experiência política de vários governantes tem servido a missão fundamental de esmagamento do Estado (por reduzir a capacidade de oposição crítica às decisões centralizadas pelas Finanças) e tem potenciado os danos colaterais da redução de despesa ao não permitir antecipar consequências mais danosas para o próprio objetivo de redução de custos. Nesta medida, a falta de qualidade do governo tem amplificado largamente os efeitos negativos dos constrangimentos orçamentais.

No dia em que o PS apresenta a sua censura ao atual governo é inevitável pensar no amanhã. Que política seguir? O que se pode fazer de diferente que seja consequente e garantido? Que forma de percorrer um caminho que nos restabeleça a esperança?

Tentarei ao longo dos próximos tempos ir sublinhando e pondo à prova algumas hipóteses de trabalho e de opção política que podem fazer a diferença.

A quem compete tal demanda? Que tal perguntar ao contrário: a quem não compete pensar e encontrar uma melhor forma de gerir o país?

Bem hajam.