No meu primeiro emprego, numa multinacional americana, os quadros intermédios eram escolhidos recorrendo a critérios vários. Por um lado uma genuína avaliação do potencial dos quadros a recrutar, por outro, uma espécie de quota atribuida aos filhos e familiares de clientes, potenciais clientes e outras figuras que convinha estar de bem com. Tirando o facto de se tratar de uma auditora financeira, onde deveria haver algum cuidado específico com estes favores para preservar a imagem de imparcialidade – activo fulcral dessa empresa – até se poderia compreender este critério misto: negócios são negócios e admite-se que seja tão importante ter quem trabalhe como ter quem pague o serviço… Salvaguardadas as devidas e saudáveis proporções, naturalmente.
A enumeração feita pelo Correio da Manhã sobre o quadro de pessoal dessa entidade pardacenta que é a PT trouxe-me à memória essa minha experiência passada, mas pelos vistos na PT as coisas são diferentes, uma vez que em nenhum momento se reconhece fazer-se aquilo que é normal em muitas empresas privadas: contratar influência.
Depois do que por aqui se tem escrito e das interrogações deixadas nos posts imediatamente anteriores é caso para dizer A nossa esperança está nos filhos! (Via Causa Nossa).
O artigo faz uma mera enumeração que talvez ajude a perceber melhor alguns acontecimentos da nossa história recente. Uma enumeração parecida aliás com a que se poderia fazer no grupo EDP (pelo menos aqui há dois ou três anos, se não agora).
Somos um país de galinhas de óvos de ouro. O que está mal nisto tudo é ver como o Estado nos sucessivos governos do sempre-eterno bloco central têm “impedido” a PT de ir à luta com as mesmas armas da concorrência, “obrigando-a” a conservar o domínio sobre infraestruturas várias, bem como monopólios específicos e regionais em diversos mercados. A PT sublinhe-se, para-privatizada (nem sei o que lhe chamar!), com accionistas ilustres com as suas muitos próprias e empresariais agendas particulares (entre os quais se destaca pela dimensão da posição accionista o BES, por exemplo).
Nada deste histórico terá que ter a ver com quem a PT contrata, naturalmente, mas desperta todas as atenções e permite-nos todas as dúvidas. Até mesmo aquela velha e sempre interessante questão à cerca da condição do Pai Natal.
Ah, já agora, a auditora em questão deu que falar uns anos depois… chamava-se Arthur Andersen.
2 replies on “A Cesar o que é de Cesar”
Caro Rui,
Por acaso também por lá andei, no ramo do Consultings, mas a conversa acaba por ser a mesma.
Quanto ao seu post, tudo bem, apenas lhe falta o epílogo.
É que um tipo até pode entrar porque o paizinho pode ter voto na matéria da aquisição de um SAP, por exemplo.
Mas se depois ele não pedala a bicicleta com muita força, só se o paizinho for dono da empresa onde o SAP vai ser instalado é que passa a primeira eliminatório, vulgo passar a senior. E mesmo assim tem que dar ao pedal …
E para passar a manager, então o paizinho tem que ser ADM de uma PSI30 ou coisa que o valha, e o menino tem que ser pelo menos tão bom como os outros …
Quanto a passar a senior manager e a partner, ai dificilmente há paizinho ou familiar que o valha.
É mesmo a doer e o tipo tem que ser mesmo bom.
Chama-se a isto uma meritocracia e é por isto que as consultoras são uma GRANDE escola.
Costumo dizer aos meus alunos e amigos que não vale a pena pagar por um MBA em Portugal quando o podemos fazer de borla na vida real (e ainda por cima ser pago por isso …).
Em relação à PT, eles lá sabem o lastro que por lá têm … Mas quer-me parecer que o “conde” têm os dias contados. E com ele, todos os cortesão que se têm acumulado ao longo dos últimos anos nas Picoas.
Estou certo que o mercado de capitais punirá devidamente não só este forrobodó como outros “uzos” indevidos da empresa para actividades heréticas.
Cumprimentos,
É bem verdade o que diz Laranjada. Oferece-nos um bom epílogo, sem dúvida. Só uma nota adicional: em regra são poucos os que querem trabalhar mais de dois ou três anos nessas empresas. É mesmo para compor o currículo e fazer a escola (pessoalmente não arrependi de por lá ter passado). Até por isso, daí em diante a empresa fica bem mais livre para uma meritocracia completa.
Espero que tenha razão nessa experiência depuradora que adivinha para o futuro próximo.