O Português…
A propósito da indignação do Aviz que se lê aqui:
Conheço uma professora de português, com cerca de 30 anos de carreira que, perante os manuais à escolha (e particularmente perante o que a sua escola escolheu), resolveu assumir a responsabilidade de escrever o seu próprio manual ou sebenta.
Entre textos próprios, peças completas dos autores do currículo – que não os excertos tristemente truncados que surgem em alguns manuais, por vezes nas partes mais nobres e instrutivas para o exemplo que visam destacar -, recortes, opiniões e outros contributos, escreveu e reescreve quase todos os anos um manual de português.
Tudo é artesanal, tudo sai do corpo e das horas que poderiam ser destinadas à família, à leitura, ao lazer. Os seus leitores são exclusivamente os seus alunos e os bons resultados que vai conseguindo têm-lhe dado força para conquistar o direito a recusar os manuais adoptados. Tudo isto se passa numa escola pública da grande metrópole.
Hoje, (só agora!), já depois do início do ano, a equipa de português percebeu que o manual que escolheu adoptar e recomendar aos alunos é particularmente mau. Que fazer? Pedir desculpas aos pais e pedir-lhes para comprarem outro menos mau? Deixar rolar porque ninguém está com atenção para o que se passa na escola?
Temo que ninguém se lembre do exemplo da colega que ainda luta por valorizar o que faz e por respeitar os alunos que lhe cumpre educar.
October 12th, 2003 at 10:26 am
Os bons professores seguem pouco os manuais adoptados pela escola. Vão lá buscar ideias e alguns textos, mas usam quase sempre textos deles, fruto de anos de investigação e experiência pessoais. Há textos que nunca viriam num livro escolar, mas que quase decorei e que hoje me aportam tanta satisfação pela sensibilidade ou profundidade.
October 12th, 2003 at 2:45 pm
Concordo em absoluto. O pior são os maus professores ou os inexperientes que precisam de apoio. Muitos se apoiam nos manuais que parecem conduzi-los cada vez mais à banalidade e à ignorância…A eles e aos alunos, um descalabro!
October 12th, 2003 at 5:15 pm
Estou assustado com isto, infelizmente nunca me apercebi que a situação era tão má!
October 12th, 2003 at 7:37 pm
Tenham lá calma porque eu considero que existem manuais de boa qualidade. Falar mal é sempre mais fácil, eu sei!!
October 12th, 2003 at 9:52 pm
Esperemos que sim, que tenhas razão Gotinha. Aliás, acredito que haja bons manuais, mas não é isso que está em causa. Há maus manuais, com erros grosseiros que estão a ser adoptados por escolas. O problema é que esse manuais não deviam ser sequer opção. Essa deveria ser a primeira garantia. Uma garantia que nos defenderia de “delegados de propaganda das editoras” e de professores pobres de princípios, permeáveis a certas prendas. Nesse caso, o pior que teríamos seria corrupção qualificada sem externalidades negativas sobre os alunos. Com o que conheço da voz pública resta-me acreditar em dois cenários: ou há incompetência entre os funcionários do ministério que avaliam os livros ou estes estão ao serviço de interesses alheios aos das suas funções. Poderá haver uma terceira hipótese mas falha-me imaginação. Não ouvi (posso não ter ouvido de facto) funcionários queixarem-se de falta de tempo ou de qualificações para avaliar condignamente os manuais. Se não existe o sistema de avaliação que imagino existir então a culpa mora ainda mais acima, ao nível político, mas julgo que não é o caso. É um problema recorrente, mais ou menos publicitado em cada novo ano. Aparentemente mais exposto agora.