A política em discurso vicioso – epílogo
Os partidos tipicamente mais votados no país alegremente desperdiçaram (e desperdiçam) o capital de responsabilidade (responsabilização) com sucessivos erros de escolha para cargos chave na nossa democracia representativa e com sucessivas divergências entre o apregoado em campanha e o cumprido em funções.
Quero com isto dizer que rasgando os cartões de militante qualquer um se pode arvorar em salvador da pátria enquanto que os que o preservarem ficarão manchados para sempre?
Era bom que fosse assim tão simples. Hoje mesmo promoveria aqui na rua uma queima de cartões numa recordação serôdia das festas populares!
O meu propósito com isto tudo (com o 1º, o 2º e o 3º texto) não é o de vir pedir o voto por alguém. É antes o de exigir que não se faça do que menos interessa para a reflexão e acção política o cerne da questão. É exigir que se faça da transparência na acção governativa um objectivo sério e fulcral.
Estou pouco preocupado em medir quem é que tem mais ou menos sede de protagonismo ou em saber quem é mais ou menos puro no coração (aqui o desinteresse resulta de saber esse objectivo inalcansável).
Gostava que se encarasse como natural a existência de concorrência local, regional ou nacional de alternativas não filiadas em partidos políticos.
Ninguém tem mais legitimidade democrática do que aquele que conquiste mais votos no pleno respeito pela lei.
Em política, os pergaminhos em defesa de bons princípios só devem justificar uma preferência quando esses mesmo princípios forem ainda devidamente acarinhados no presente. Pensassem assim mais eleitores e, com eles, mais políticos, e seguramente que não haveria necessidade para todo este discurso.
Na política lusa (a outra quase desconheço) predominam os políticos com stress pós traumático, indivíduos cheios de potencial, em alguns casos, que ao mais pequeno estalido reagem com um pulo para a metralhadora que espreita sempre bem lubrificada lá da sua trincheira. Da passagem da boa política para um acção desfasada da realidade e alheia aos ditos bons princípios democráticos vai apenas um dedo no gatilho.
Como todos os traumatizados de guerra a atravessar um episódio de crise, a própria auto-preservação do político passa a ser a única razão de ser. O problema não está na inatural e desejável auto-estima, o problema está na intensidade de severidade com que a auto-preservação domina todos os gestos, palavras e omissões. Esta doença que pode atacar independentes ou encartados militantes, não me parece surgir menos representada entre estes últimos, infelizmente.
Posto isto termino com a minha declaração de voto para a primeira volta das eleições para a Câmara Municipal de Lisboa.
Votarei no candidato que penalizará a gestão cessante e o partido que então a suportou.
Votarei no candidato que mais puder contribuir para que todo o executivo tenha de arregaçar as mangas e viver a gestão da câmara como o seu principal desafio profissional dos próximos dois a seis anos.
Votarei no candidato que me der maiores garantias de valorizar o meu voto, em permanência.
Votarei no candidato que mais garantias me der de que não ficará enredado em compromissos e amizades do passado que pouco tenham a ver com os interesses directos e futuros dos residentes de Lisboa.
Votarei no candidato que me dá garantias de equilibrar a humildade indispensável para enfrentar os graves problemas da cidade e da sua câmara e a capacidade de decidir e de inovar não ficando tolhido pela enormidade das dificuldades e das pressões interesseiras que naturalmente circundam o poder autárquico.
Votarei, democraticamente, no menos imperfeito dos candidatos em concurso.
Votarei em… Mais do que dar-lhe o nome ou a indicação do quadradinho onde há-de pôr a sua cruzinha, convido o leitor eleitor em Lisboa a fazer como eu. A votar bem e a estar por aqui no dia seguinte a exigir mais e melhor do primus inter pares que vier a ser eleito.