"Os certificados de aforro estão, a partir de hoje, sujeitos a uma taxa de juro mais reduzida, apurou o Jornal de Negócios. O Governo alterou, pela primeira vez em dez anos, a fórmula de cálculo: o produto passa a ser remunerado a 80% (em vez de 94%) sobre a Euribor. (…) A taxa base anual é definida todos os meses, com base na evolução da Euribor a 3 e a 12 meses que vigorou no mês anterior (são consideradas 20 observações para efeito de cálculo), e, ao que o Jornal de Negócios apurou, o valor que vai vigorar em Agosto será de 3,151%. Os juros que os aforradores recebem anualmente, não são, contudo tão elevados, porque os portugueses vão receber apenas 80% deste valor global, ou seja, vão ser remunerados à taxa anual nominal bruta de 2,5208%.
No entanto, se o secretário de Estado do Tesouro e Finanças, Carlos Costa Pina, não tivesse revisto agora o método de cálculo, ou seja, se continuasse a ser aplicado o ponderador de 0,94, então os detentores de certificados de aforro iriam receber juros anuais brutos de 2,9619%."
Numa conjuntura em que o número de portugueses a aplicar as suas poupanças em Certificados de Aforro está a aumentar (como foi recentemente noticiado na imprensa), o Estado decide reduzir a remuneração que paga pelos mesmo. Da perspectiva do aforrador será que continua a fazer sentido apostar neste investimento?
Os Certificados de Aforro são um instrumento simpático que o Estado tem ao seu dispor para se financiar a baixo custo. Historicamente remunerando por via de uma taxa concorrencial com os depósitos a prazo da banca tradicional e somando-lhe um prémio de permanência que atinge o seu valor máximo quando o investimento fica a amadurecer até aos 4 anos e meio (remuneração semestral de 0,2% líquidos até um máximo acumulado de 1,6%), este é (justificadamente) o instrumento favorito de muitos portugueses.
Tenho para mim que sendo um instrumento a que poucos investidores ficam indiferentes na constituição das suas carteiras de investimento, ele é particularmente caro para uma larga fatia de portugueses pouco rotinados em gerir de forma activa as suas finanças. Afinal, trata-se de um produto disponível em qualquer estação dos correios do País, tradicional (com várias décadas de história), percebido como totalmente seguro por toda a população, e muito popular entre a população mais propensa à poupança, tipicamente idosa e residindo no interior país. Não tenho estatísticas sobre a captação dos certificados mas é esta percepção que tenho com base no senso comum e em alguma experiência pessoal.
Se estes meus pressupostos estiverem correctos, com a redução da taxa de referência para a remuneração dos certificados, sabiamente aprovada num momento de subida das taxas de juro que permitirão dissimular a quebra da remuneração paga pelo Estado aos seus aforradores, serão os portugueses menos conhecedores e com menos acesso aos instrumentos do mercado financeiro que mais sairão prejudicados por esta medida do governo socialista. Objectivamente, num momento em que o próprio Estado se vê confrontado com ter de pagar mais pelo dinheiro que pede emprestado no mercado financeiro, este aproveita para penalizar os aforradores que durante as últimas décadas lhe têm emprestado dinheiro às algumas das melhores taxas que o Estado consegue obter no mercado. A expectativa do Estado será a de que a rigidez ou falta de capacidade de resposta dos aforradores aliada à dissimulação por via da subida das taxas de mercado lhe oferecem permita obter o melhor dos mundos: conseguir manter ou aumentar a poupança que consegue captar passando a pagar relativamente menos do que pagava até aqui, reduzindo assim o seu encargo da dívida numa conjuntura particularmente desfavorável.
Será uma boa medida de gestão financeira? Da perspectiva do aforrador é legítimo falar de sacanice do Estado, do ponto vista do Estado está para se ver se compensa.
Uma coisa é certa, o aforrador com esta medida do Estado, terá todo o interesse em considerar urgentemente outras alternativas para aplicar as suas poupanças. Dificilmente encontrará boas ofertas na banca tradicional (ainda que não seja impossível). Isto acontece também em larga medida por responsabilidade indirecta do Estado que, recorde-se, através da Caixa Geral de Depósitos tem vindo a aumentar de forma chocante o diferencial entre o que cobra pelo dinheiro que empresta e o que remunera pelos depósitos que capta desde que as taxas de referência (Euribor) iniciaram a sua tendência de subida. Concretizando, ontem a CGD voltou a aumentar as suas taxas de crédito à Habitação mantendo as taxas com que remunera o depósitos a prazo fixas desde Setembro de 2005, altura em que a taxa de referência de mercado era inferior à actual em cerca de 1,25%.
Perante este cenário, o que fazer então sem alterar a minha política de aforro de risco zero?
Há bancos nacionais particularmente orientados para a banca on-line que oferecem produtos clássicos – como os depósitos a prazo – com remunerações que já eram mais elevadas para investimentos de curto prazo do que os Certificados de Aforro e que assim passam a ser também mais interessantes a médio prazo. Dou como exemplo o Banco Bigonline (vocacionado para Internet mas com balcões tradicionais em Braga, Porto e Lisboa) que hoje , para um prazo de três meses, em vez dos 2,52% dos certificados oferece uma remuneração de 3,21% e que, para um prazo de um ano, remunera a 3,52% contra cerca de 3% dos certificados – taxas brutas (tabela do Big Online).
Outra alternativa muito interessante para quem tem crédito à habitação (ou qualquer outro) será a de sacrificar alguma liquidez que tenha a render uma ninharia no banco ou nos certificados e amortizar o seu empréstimo – nesse caso o juro implícito que recebe será anda maior e o risco desse investimento é, naturalmente, nulo protegendo-se inclusive dos futuros aumentos das taxas de juro crescente que pairam no horizonte próximo.
Neste, como em muitos outros casos, cabe ao agente mais pequeno, neste caso ao aforrador, fazer pela vida e literalmente pôr o mercado a funcionar, garantido assim que as estratégias inteligentes dos seus interlocutores tenham a devida resposta, agindo e premiando quem lhe oferece as melhores condições do mercado.
Em suma, o sucesso da estratégia do Estado e da banca tradicional depende em alguma medida das nossas atitudes singulares, sendo neste caso particularmente evidente que a estratégia destes é claramente penalizadores para quem poupa. Dito isto, restam menos motivos para o leitor aforrador continuar a perder tanto dinheiro… É que a Internet não tem de ser um bicho papão e os bancos autorizados (vocacionados para o balcão ou para a internet) terem todos a mesma garantia de solvabilidade do regulador, ou seja, do Banco de Portugal.