A notícia de ante-ontem: Ante-ontem líamos um comunicado do primeiro-ministro Timorense declarando que a proposta da italiana ENI para explorar dois blocos petrolíferos no Mar de Timor era mais vantajosa que a feita pelo consórcio formado pela Malaia Petronas, pela Brasileira Petrobras e pela semi-portuguesa Galp. Não tendo conhecido os detalhes que fundamentaram essa decisão, sou levado a crer que se resumem a importantes diferenças ao nível das contrapartidas financeiras para Timor e que a política terá tido pouco a ver com a matéria, aliás espero que tenha sido exactamente assim…
Tanto quanto sei esse mesmo Mar de Timor é largamente explorado pela Austrália fruto de negociações directas entre os dois Estado sem ter havido qualquer concurso publico internacional. O acordo quanto às respectivas delimitações das águas territoriais e os direitos adquiridos pelos Australianos quando a plataforma continental do mar de Timor era administrada a partir de Jacarta valeram nessas negociações tendo ficado claro que, nesse momento, a administração timorense soube pesar mais do que os factores económicos para esquecer alguns dos argumentos legais que lhe poderiam valer outro tipo de contrapartidas.
A notícia de hoje: Tudo o que está a acontecer em Timor foi devidamente antecipado e enunciado a quem quis ouvir. À micro-escala do país vemos a repetição de uma história contada demasiadas vezes em vários continentes, em vários países emergentes. Com alguma ligeireza podemos dizer que nada disto parece ter sido devidamente antecipado pelas Nações Unidas no único Estado do mundo que foi criado sob seu patrocínio e intervenção. A falha maior da ONU terá sido a de se enganar nos timmings: um Estado independente com a história de Timor leva mais tempo a consolidar, contudo, é também já um argumento desconfortável. Parece-me razoável afirmar que a ONU cumpriu o seu papel tendo tentado colocar sempre a pressão sobre os Timorenses – talvez por motivos mas invíos do que o que transparece deste raciocínio linear. Colocou a pressão sobre os Timorenses com Portugal a ter um papel importante, sublinhe-se, no sentido de protelar a saída integral consciente dos riscos da impreparação técnica e das feridas internas ainda existentes. A pressão em si não me parece ter sido negativa pois incidia sobre um povoarreigado a uma espécie de paternalismo inscrito por décadas (para não ir mais longe) de subjugação.
Hoje, ex-guerrilheiros promovem a guerra civil e os órgãos de soberania apelam ao apoio militar urgente de portugueses, malaios, australianos e neo-zelandeses, antes que seja tarde demais.
Hoje, muitos timorenses voltam a fugir de suas casas, muitos portugeses temem pela segurança dos seus filhos aí imigrados ao serviço do ministério da educação; Australianos, Norte Americanos diplomatos e funcionários da ONU preparam malas para um retirada rápida. E os Timorenses voltam a pegar em armas uns contra os outros.
Por mais esforços de racionalização e de entendimento que se façam há um facto ineludível, neste momento Timor é um Estado falhado e com futuro muito incerto.
Nós por cá, que sentimos Timor como nenhum outro evento histórico nos últimos 20 anos (nunca me esquecerei daquele momento na Avenida da República em que também participei saudando a chegada do Bispo Ximenes Belo) começamos a dividir-nos entre os que chutam as pedras do chão e os que mantêm a centelha voluntarista de ajudar (como parece ser o caso do nosso Governo).
Cuidado. Cuidado que os Timorenses dão provas sucessivas de não saberem exactamente qual querem que seja o nosso papel mesmo em sítuação de estabilidade. Cuidado que hoje as divisões em Timor deixaram de ser latentes e ainda não é claro se a batalha se justifica apenas porque se procedeu a uma desmobilização inadequada de parte da guerrilha.
Mais vale que ao menos nós saibamos até onde estamos dispostos a ir com plena consicência dos riscos e que tipo de tratamento estamos dispostos a exigir amanhã.
Assumir o papel de educador de filhos na puberdade quando eles se metem em sarilhos fazendo-o exclusivamente na base do voluntarísmo é prestar-lhes um péssimo serviço.
Além das justificações do nosso passado e história comum, é tempo de perguntarmos e respondermos em nome de que relação futura vamos mandar um contingente militar para Timor.
Adenda: "Timor Leste: sem surpresas" pelo Paulo Gorjão no Bloguítica.
Adenda II: "Timor" pelo João Morgado Fernandes, há alguns dias no DN.
Adenda III: "Timor Leste e a estória da História" pelo Luís Novaes Tito no Tugir.