Sobre o choque tecnológico e os detalhes que se lêem no programa do PS, um conselho emprestado.
Muito provavelmente o próximo governo fará mais por estimular o desenvolvimento tecnológico do país se, em relação ao que já compra e ou que de novo desejar adquirir, for um cliente exemplar na exigência de uma boa prestação de serviço/fornecimento, do que pela implementação de qualquer medida de subsidiação que venha a praticar.
O político condicionará o que encomendar, podendo desencadear um “choque” de qualificação na administração pública de acordo com o seu ideário político/operacional. Condicionará as áreas prioritárias de investimento público – podendo privilegiar as “intensivas em tecnologia”. Determinará o perfil dos recursos humanos a contratar, dos equipamentos; em suma fará o pedido ao mercado. Contudo, deverá garantir que seja a concorrência leal no mercado a prover-lhe aquilo de que necessita. O peso do Estado cliente na economia poderá ser o elemento decisivo para o desenvolvimento, ou não, de alguns projectos inovadores no país, poderá, sublinho. No entanto, não deverá condicionar a escolha dos vencedores por preceitos de “interesse nacional”. O concurso deverá ser público e internacional, salvo raríssimas excepções.
Naquilo que politicamente for definido ser a esfera do Estado, este deve ser servido pelos melhores entre os melhores. A máxima é esta e será já um choque implementá-la.
Além disso, canalizar verbas para subsidiação será retirar investimento necessário à racionalização da Administração Pública. Uma racionalização que, não tenho dúvidas, para ser bem sucedida exigirá em muitas organizações do Estado investimento considerável.
A prática de atribuição de subsídios e criação de benefícios fiscais ao sector produtivo, neste país, tem-se revelado desastrosa para muitos, particularmente para a classe média que tem sido crescentemente chamada a contribuir para o financiamento do Estado. Não nos enganemos, não é José Sócrates que me dá garantias de transformar as raras excepções positivas de intervencionismo do Estado junto das empresas, em prática generalizada. Tenho ainda alguma esperança que tenha competência para condicionar positivamente e de forma informada as tais prioridades de que falo.
Se conseguir fazer do Estado um cliente modelar já terá valido a pena votar neste PS, e a próxima legislatura já terá valido mais a pena que qualquer uma das anteriores.
Não nos iludamos, a tarefa é suficientemente árdua e exige conjugação com a aposta na desburocratização e no reforço do papel regulador do Estado. Exige, obviamente, um combate duro contra muitos interesses parasitários (pois todos os subsídios e benefícios em vigor deverá ser criteriosamente escrutinados). Um combate duro contra muita corrupção instituída e latente. Um tipo de corrupção que, pasme-se, na cabeça de muitos infractores (políticos inclusive) não é já percebida como tal.
Essa era uma guerra que gostaria de ver José Sócrates comprar. Antes de eventualmente podermos desenhar medidas de intervenção pontual e temporalmente bem limitadas por parte do Estado, há esta prova crucial a superar. Uma prova a ter em mente do primeiro ao último dia de governação e que nos ajudará a todos a perceber e interiorizar uma das premissas fundadoras de democracia: a política ao serviço do país, de todos os portugueses.
Julgo que na mesma linha, ler o editorial de hoje de Sérgio Figueiredo no Jornal de Negócios.