Esta é para o Paulo (a propósito desta, desta, entre outras).

Como já aqui disse, o cenário do PS ter de assumir-se como alternativa governativa passou a estar em cima da mesa de forma iminente desde que Durão Barroso decidiu que concorreria à Comissão Europeia.
Ferro Rodrigues saiu pelos motivos conhecidos e desde então o PS teve uma das mais originais campanhas eleitorais internas para o cargo de Secretário-Geral. Na minha opinião a campanha esteve muito próximo do preto e branco, servindo para sublinhar dois ou três pontos de distinção ideológica e de estilo. Nesse sentido foi uma lufada de ar fresco.
Como então sugeri, haveria, no entanto, todo o interesse para o país e para o PS que a discussão fosse além do socialismo de cada candidato e haveria todo o interesse em que progressivamente, ao longo da campanha, cada um se comprometesse com opções concretas sobre o que faria caso chegasse a primeiro-ministro. E foi Sócrates quem mais alto clamou ser candidato a primeiro-ministro caso vencesse…
Recordo-me de a dada altura ainda a campanha ir no início, ter por aqui notado saber-me a pouco o que via e ouvia de Sócrates. Recordo-me também (espero não estar a ser traído pela memória) de teres, Paulo, demonstrado alguma confiança em como até ao fim da campanha esse debate, esse maior esclarecimento vir ainda a ocorrer. Ele não quereria gastar todas as munições logo no início…
Contudo, o que ficou foi o “choqueâ€? tecnológico proposto por Sócrates logo em inícios de Agosto; a única bandeira agitada que retive e que ainda este fim-de-semana foi retomada. A oportunidade de umas primárias elucidativas cumpriu os seus objectivos apenas no plano estritamente “políticoâ€?. A concorrência era tão fraca que Sócrates não precisou de usar mais argumentos ou simplesmente não os tinha? Eis uma pergunta que Sócrates permitiu que ficasse para a posteridade.

Ganhas as eleições ainda havia tempo para o resto, não era esse o tempo para assumir compromissos (rupturas?) afirmou Sócrates.
Muito bem… O pior é que chegados à concretização da tal “iminênciaâ€? de ter de assumir a alternativa, a imagem que prepassa é que tudo está por fazer; reforça-se o empenho no rendimento mínimo, na defesa das SCUTS e dos PPR’s e…
Feita a desmontagem mais superficial permito-me uma outra que é coerente com o que aqui me tem “indisposto” com o Sócrates, entravando a minha motivação em ir em seu apoio.
Há quanto tempo pensará Sócrates concorrer um dia a Secretário-Geral? Não acredito que seja ideia de 2004. Não terá nestes anos anotado num qualquer caderninho ideias de sua própria lavra, até pela experiência de Governo que teve? Não há nada que tenha sublinhado como aspecto a corrigir que pudesse apresentar como distinção inicial, como caracterizador de si próprio enquanto candidato a Primeiro-Ministro? Ou será tudo tão congeminatório que nada poderá servir-lhe de auxilio público perante os eleitores internos e externos? Haverá tutano em José Sócrates? Mais uma pergunta que ainda perdura e que seria seguramente bem aproveitada não fosse oseu opositor primordial quem é: o paradigma da incredulidade, Pedro Santana Lopes.

Com base nestas mesmas constatações, atrevo-me a dizer, vens agora imputar (em boa companhia reconheço) ao Presidente da República a responsabilidade de não ter escolhido o melhor dos tempos para dissolver a Assembleia porque a situação ainda não estava suficientemente madura para cair de podre. Fundamentas as críticas ao Presidente e os que como eu defenderam que já não era sem tempo convocar eleições antecipadas, por um lado, com a nível insuficiente de “apodrecimentoâ€? do Governo – mais podre do que está não fica, digo eu – e com a destruição dos timmings de construção de uma alternativa por parte do PS cuja realização se centrava/centra nos Estados Gerais – “Novas Fronteirasâ€?.
Feita esta análise profetizas “o pior dos cenáriosâ€? citando Mário Mesquita:
“A eventual e previsível vitória do PS de José Sócrates nas legislativas de Fevereiro de 2005, se ficar pela maioria relativa, significará, passado o breve estádio de graça, o início de mais um período de instabilidade governativa e parlamentar, que dará tempo ao PSD para “arrumar” a casa e a Cavaco Silva para continuar a preparação da viagem para Belém.â€?

Sócrates terá tido pouco tempo, mas o pouco que teve desaproveitou-o. O seu estilo e a sua forma e, principalmente, as suas prioridades de ocupação do tempo nestes últimos meses talvez fossem as ideais para uma situação “normalâ€? de um novo secretário-geral. Construir as “pontesâ€? internas, consensualizar, o que for. Mas perante os riscos latentes na vida política nacional e até perante a original forma de eleição, Sócrates começou muito mal ao não ter a visão da conjuntura política, social e económica do país e, fundamentalmente, ao não perceber a urgência e dificuldade da sua missão prioritária.
Desde o primeiro momento que a sua preocupação – desde que se candidatou a Secretário-Geral! – Sócrates devia assumir a sua responsabilidade por estar disponível para oferecer uma proposta coerente, determinada e informada à governação do País. Preferiu uma espécie de catenaccio… Ou um jogar à Grega como no Euro 2004. Até pode ganhar com maioria absoluta, mas não é disso que Portugal precisa.

Ainda haverá tempo? Espero bem que sim, quase todos os bons remendos serão melhores do que o que este último governo fez pela descredibilização da política aos olhos dos portugueses. E depois é preciso não esquecer que até costumamos ser bons no desenrasca… E se todos derem um jeitinho…

O problema que enuncias não é táctico, mas sim de apreciação estratégica e quem mais deve jogar pela estratégia é quem a prazo quer chegar a Primeiro-Ministro. Ao presidente não cabia dar uma segunda oportunidade a quem recusou ir fazendo os trabalhos de casa que interessam ao país.

P.S.: Devo sublinhar que este “erro de avaliação estratégica de que falo” é perfeitamente “natural” no contexto político português dos últimos anos. Como justificação tem piada recordar este texto citado há poucos dias aqui no Adufe.

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