O João Guerra (ver comentário do João aqui ou no anexo a este texto) considerou excessiva a minha reacção face às declarações de ontem de Carlos Carvalhas e Francisco Louçã. Concedeu, contudo, que as opiniões de ambos são “um pouco demagógicas”. Lendo o que escreve o João percebo que estou largamente de acordo com ele mas separa-nos uma questão de grau nada irrelevante na minha opinião. Ouvindo bem o que disse Louça e o que disse Carvalhas percebe-se que a sua posição é bem diferente da de Zapatero, por exemplo (volto a remeter para o artigo de Teresa Sousa disponível no Público).
As diferenças são demasiadas para lhes chamar “palavras um pouco demagógicas“. A demagogia aqui, nesta matéria muito concreta, é absolutamente nefasta e traduz a perfeita irresponsabilidade que prometem numa futura aliança governativa com o PS. É agora, antes de irem a votos que têm de dar provas da possibilidade de um entendimento, de maturidade política e o BE, especialmente – o único de que vale verdadeiramente a pena falar -, vai andando sucessivamente para a frente e para trás.
A cada novo vislumbre de esclarecimento e desprendimento face a um discurso estereotipado surgem os ataques da pior demagogia de Louçã que deitam por terra a credibilidade anteriormente conquistada com outras causas.
O BE apresenta-se como uma equipa com um “futebol” ainda muito irregular que faz suceder a excelentes prestações, as piores cenas de pancadaria. Uma bomba relógio num eventual governo em coligação.
Falando em coligações:
É claro que há ainda outro lado da questão num cenário de coligação que é o PS. Já nem aprofundo as consequências de uma coligação perante a actual fragilidade e mais que evidente inoperância da liderança socialista. Ter um PSD/PP revisitado mas desta vez à esquerda é um cenário igualmente assustador.
O PS que se emancipe (eu não acredito que estou a escrever isto!), que se afirme por si, que faça por merecer a confiança dos portugueses, que demonstre ter capacidade de governar e que tem soluções para os problemas do país e que as divulgue… Se, nesta conjuntura, o PS viesse a falar de uma coligação estaria nitidamente a promover uma fuga para a frente, um fait divers, um pedido encapotado de uma carta em branco ao eleitorado, a reclamação do direito ao poder por manifesta incompetência do adversário, ora, por esse caminho, nada de muito positivo nos esperará.
(Ainda) não temos à esquerda a possibilidade de somar votos em coligação. Notem que não critico a impetuosidade do BE, o dinamismo dos seus deputados… Também eles poderão fazer um caminho interessante. O desafio será não perder a estamina ao mesmo tempo que se aproximem de um programa político sustentável, integrado e execuível. Nesse dia e sem melhoras no PS até eu mudo de voto. Até lá não vou em encantamentos ou em males menores.
Sujeito a ligeira revisão às 21:05 em defesa do bom português
Caro Rui:
Creio que há um exagero nas reacções às palavras dos Drs. Carvalhas & Louçã. É claro que as palavras destes dois também são um pouco demagógicas, mas é perfeitamente possível defender o regresso das tropas ao serviço do império, em particular as portuguesas & espanholas, e defender uma politica anti-terrorista mais determinada e mais eficaz do que a actual.
Tudo tem a ver com as premissas de que partimos. Se pensarmos (como eu penso) que as guerras contra estados árabes (ainda que ditatoriais) prejudicam a luta anti-terrorista ao fomentar o fanatismo islâmico e a argumentação destes fanáticos, então a guerra do Iraque deveria ter sido evitada e a ocupação do país deve terminar quanto antes.
A argumentação dos fanáticos islâmicos baseia-se em grande parte numa mistura entre religião barata e defesa (demagógica) dos territórios árabes contra os “invasores infiéis”. Uma das obsessões destes fanáticos é, por exemplo, considerar que o Al-Andaluz, antiga civilização árabe da Península ibérica (que ocupou durante vários séculos aquilo que é hoje a Andaluzia, o Algarve e o Alentejo) é território árabe ocupado por cristãos. De facto, é o único território importante que já foi de domínio islâmico e agora não o é. O Bin Laden fala disto na cassete que enviou a reinvindicar o 11-S.
Como é óbvio, quando as tropas do império ocupam outros países árabes (como o Iraque), toda esta argumentação da terra mãe do islão violada pelos infiéis judaico-cristãos vem ao de cima e a propaganda da Al-Qaeda e afins torna-se muito mais eficaz.
Tendo isto em conta, na minha modesta opinião, a forma mais eficaz de combater este terrorismo é fornecer mais meios e mais financiamento às policias e aos serviços nacionais de informação, coordenar melhor estes serviços, usar a infiltração de agentes dentro destas redes e sub-redes de terroristas (técnica utilizada com muito sucesso pelas forças policiais espanholas contra a ETA) e todo o tipo de técnicas policiais e de espionagem (dentro da lei, claro) para apanhar estes fanáticos e desmantelar as suas redes. A colaboração com as forças policiais dos países árabes também é essencial.
A guerra contra um estado soberano (como o Iraque) só pode ser legitimada pela guerra anti-terrorista se este estado proteger e fomentar grupos terroristas e se não for possível alterar a situação de outro modo – apoio a oposições internas, espionagem, etc… Foi o que sucedeu no Afeganistão que claramente apoiava a Al-Qaeda.
É evidente que o Iraque não fomentava nem apoiava quaisquer grupos terroristas. Sendo assim e para não prejudicar a luta anti-terrorista há que terminar com a ocupação. É claro, e aqui está a demagogia de Carvalhas & Louçã, que a retirada deve ser feita de forma a não fazer mais estragos que aqueles que já foram feitos. Por isso, e tal como defende o PSOE, o correcto é exigir que o comando das forças no terreno passe para a ONU e que, se possível, integre tropas árabes de forma a diluir as forças do império e o que elas representam naquelas paragens. Se os americanos não estiverem interessados nisto, a coisa resolve-se sem mais estragos e podemos pensar em deixar instalado no Iraque um regime mais ou menos democrático e um Iraque mais ou menos pacificado (embora isto seja dificil). O problema é que a cabeça do império não parece interessada em entregar o poder à ONU. Afinal, depois de tantos problemas diplomáticos, depois de tantos soldados americanos mortos, nem sequer vão poder ganhar uns contractos de exploração de petróleo a preço vantajoso para as suas multinacionais do ouro negro??? Mr. Bush says no! Para ele é impensável que seja uma petrolifera francesa (por exemplo) a conseguir os contractos milionários de exploração do petróleo iraquiano.
Quanto ao PS, BE e PCP, estou em total desacordo contigo. Estes três estão condenados a entender-se, a falar claro (sem demagogias) e a construir uma alternativa progressista a sério (até porque a nossa direita já está unida). Espero que isto aconteça quanto antes e que a derrota dos nossos proto-fachas não demore.
Saudações ibéricas.
João Guerra