Ontem de manhã fomos pedir um orçamento para um armazém com estílo – um livreiro.
O móvel tinha que ser frito e cozido ou porque a casa o exige ou porque o cliente pensa ter algum tipo de concepção estética.
A coisa correu bem em termos de conversação.
O artista – a rondar os 40 anos – apreciou o boneco (ou pôs o cliente bem disposto massajando-lhe o ego) e perante um público cordato aproveitou para dar uma aula de história da arte. Roçou ligeiramente o exagero mas no final as linguagens diferentes não impediram o entendimento.
Não sei bem como na hora e meia de conversa se passou, contudo, mais tempo a falar de política, do Estado da Nação, da história recente portuguesa e do exemplo Espanhol… O Adufe anda muito politizado – é o que me apetece e é o que aqui se lê – mas confesso que não esperava debater a monarquia, alguns traços da ditadura, a economia ou a corrupção ideológica e material de um ex-vereador comunista da Câmara de Sintra numa loja de mobílias.
A maior particularidade que retenho da conversa (e que interessará eventualmente para o Adufe) prende-se com um dos tais traços do passado que deixaram saudades no artista interlocutor: a falta de formação de novos profissionais para a indústria do mobiliário.
Queixou-se do encerramento de alguns liceus-oficina e do virtual desaparecimento de oficiais de marcenaria. Disse trabalhar com dois, ambos com mais de 60 anos, capazes de fazer maravilhas com a madeira. Rematou com esta: ganham bem mais do que muitos engenheiros.
Não lhe perguntei porque não os forma ele nem sequer lhe perguntei se não haveria a hipótese de manter a tradição na família à moda secular dos artesão…
Fiquei desconfiado que os empresários do móvel não se juntam para conseguirem formar técnicos, o Estado demora a reagir e os interessados muito provavelmente têm de ser cativados. Onde é que já ouvi esta história antes?
Enquanto consumidor, por enquanto, ainda posso escolher entre esperar mais alguns dias pela abertura do IKEA em busca do pronto a usar, massificado talvez bom e seguramente barato e o tradicional trabalho de “alfaiataria” tipicamente de elevada qualidade e bom preço. E amanhã? A continuar o rumo actual ou desaparece a segunda opção ou o bom preço passa a preço de luxo.
Pergunta ao leitor e a quem escreve: se tiveres um filho incomoda-te que ele escolha ser um oficial de marcenaria em vez de um arquitecto?