Não esperaria menos do Paulo Gorjão, acho que ficámos todos a ganhar por ter aceite o repto.
As vantagens de política externa são geralmente mensuráveis em ciclos superiores, muito superiores aos habituais ciclos eleitorais, muitas vezes sobrevivem inclusive a mudanças de regime. Fundam-se desejavelmente numa aliança entre motivos emocionais, culturais sempre que estes estejam presentes (evidentes no caso Timorense) mas também fundamentalmente racionais, utilitaristas.
Quando andámos em manifestações em defesa da liberdade Timorense era essencialmente o coração, a defesa da dignidade humana e também algum sentimento de culpa colectivo que nos movia. No meu registo muito íntimo dificilmente esquecerei o que se passou em Lisboa naquele ano. As manifestações, a visita de Ximenes Belo, depois de Xanana. Imagino que em termos emotivos terá sido o evento mais significativo da História recente do Pais após o 25 de Abril. Mas não é nesses sentimentos que termina a história, nem é por aí que deve terminar o nosso papel. Os factores que o Paulo Gorjão destaca, sublinhando a necessidade de um investimento/dedicação continuada e astuciosa por estabelecer e fortalecer relações centradas em interesses comuns presente e futuros, é uma outra realidade que deve concorrer com a primeira mas que demasiadas vezes é catalogada como amoral ou mesmo imoral e assim considerada, na melhor das hipóteses, como um mal necessário.
Na pior das hipóteses há uma espécie de ingenuidade militante em algumas áreas de pensamento político (é quase irrelevante saber se intencional ou não), geralmente características dos extremos, que desprezam ou abominam qualquer vestígio de mobilização do Estado para defender os seus interesses numa perspectiva espacial e temporal mais complexa, com o fito de obter poder negocial. E foi precisamente aqui que o Paulo chegou de forma simples e clara.
Não se adivinha nenhuma visita de algum líder chinês Portugal, nem de algum passeio de algum dignatário nacional por terras de Cuba pelo que provavelmente no futuro próximo poucos encheraõ a boca para sublinharem o odioso da política de interesses (recordo o recente texto do Aviz sobre a China, particularmente o segundo onde dá o seu contributo definindo alguns limites de raziabilidade nos instrumentos da política externa da perspectiva do leigo, que é também a minha).
O momento poderia servir para trocarmos dois dedos de conversa menos apaixonada sobre o que entendemos como aceitável (mesmo em termos morais se assim o desejarmos). Quais os limites para a nossa intervenção ao nível da política externa e concomitantemente qual o grande objectivo nacional que pretendemos ver cumprido por esse meio? O que queremos ser no mundo daqui a 10, 20 ou 30 anos? E como poderemos lá chegar? A guerra no Iraque deu-nos algumas achegas, promoveu a discussão bizarra (?) entre a antinomia (?) Atlantismo/Europeismo mas pessoalmente pareceu-me demasiado a quente, espectacular, a carecer de serenidade. Neste caso muito específico da política externa acho que os acontecimentos internacionais muito recentes podem prejudicar mais do que auxiliar quando estamos a redefinir objectivos.
O Paulo lança algumas pistas pois é evidente que o seu raciocínio descrevendo o modus operandi quanto a Timor assenta sobre uma definição clara do que deverão ser esses mesmo objectivos. Já agora em que ponto da antinomia mais popular deveremos encaixar Timor, na Atlantista ou na Europeista? Ainda bem que há Timor digo eu…
Teremos entre os políticos que nos representam ou para isso se perfilam gente com formação, capacidade e ideias claras quanto a esta matéria? São conhecidas? Esta definição política é talvez das mais obscuras para o comum mortal que viva neste pais. Se é bem verdade que a sua execução deverá ser feita em boa medida por de trás das cortinas das chancelarias internacionais há uma ideia formal, um rumo que deve ser apresentado, debatido e ratificado democraticamente, suficientemente detalhado para o seu cumprimento poder ser avaliado de forma igualmente democrática sob pena de haver até quem duvide da existência de uma política externa nacional…
PS.: The Bear and The Bull também se pronunciou sobre este assunto, mais detalhes aqui.