…gostei de ouvir Ferro Rodrigues (em entrevista na RTP 1). Manteve a serenidade, a compostura, foi claro, julgo poder dizer que reforçou a sua imagem de marca que tem andado apagada nos últimos meses: um homem sincero, inteligente e honesto onde as qualidades largamente compensam os defeitos que habitualmente lhe apontam e cujo mais repetido recorde-se é a falha no dom da espetacularidade tribunícia.
Fiquei com esperança que haja um esforço mais determinado por retomar a oposição, mas não gostei que a própria entrevista fosse prova da sua razão quando se queixa que é difícil mostrar política (sendo indispensável resistir). Mais determinação e actividade política na oposição não é sinónimo de visibilidade pública e com abutres a pairar dificilmente haverá quem vá além do mau cheiro que lhe atiram para cima. Mas se assim for o que fazer? Aos poucos, quase assoberbado com as práticas, os factos, as divulgações oportunas, os silêncios engenhosos e as declarações populistas vou aderindo à ideia de que estamos perante algo que está num patamar distinto do da novela judicial. O caso judicial é uma coisa, sobre o qual mantenho a mesma posição desde início. Mas há o outro caso, o político que temos de distinguir e tratar com a acção que no caso judicial não se recomenda.
Quase uma hora para falar da Casa Pia, escarafunchando à procura de uma frase mais mal medida, tentando uma trincadela em algum dos engodos precários que se aproximaram da verdade absoluta pela repetição nauseabunda ou mesmo tentando abrir feridas reais que tiveram o seu tempo na boca de Ferro Rodrigues e que este agora se impõe superar.
No final parece ter corrido mal a entrevista a Judite de Sousa e bem a Ferro Rodrigues. É triste chegarmos a isto, ficar a sensação de um debate entre um político e um jornalista, com vencedores e vencidos. Mas felizmente a jornalista, apesar de tudo, não teve influência decisiva no resultado das jogadas disputadas. Ainda assim, terminou o jogo antes do final do tempo regulamentar: quase uma hora para falar da casa pia, pouco mais de 20 minutos para despachar as “causas” para o país do secretário geral do Partido Socialista. Eu queria ouvi-lo falar da educação, a questão do financiamento do ensino superior por exemplo, da saúde com mais detalhe, etc, etc, etc.
Será muito difícil esta luta, a tal luta contra o populismo, a luta por conseguir ouvir (e ter quem pense) a política.
Servirá de pouco consolo (será mesmo uma trágica descoberta) mas muito provavelmente Durão Barroso arrepender-se-á do seu silêncio gritante perante o populismo que por agora vai batendo na porta ao lado. O bom democrata que me dizem ser está inteiramente toldado pelo tacticismo político. O título de bom democrata não se ganha para uma vida, perde-se com um silêncio.
Em 20 minutos de crítica, de oposição, de propostas de caminho alternativo Ferro Rodrigues fez o melhor que podia (TGV, política de redistribuição de rendimento/política fiscal, política externa…) mas tal como os jogadores que só são chamados depois do meio da segunda parte, não teve a mínima hipótese para conseguir uma boa nota. Um nota assente num pensamento estruturado que não pode enunciar.
A RTP, órgão que Ferro Rodrigues demarcou pela positiva do populismo comercial dos restantes canais, não o deixou fazer oposição. E amanhã por ventura repetirá de 30 maneiras diferentes que o PS não faz oposição… Que nos espera, como poderá o PS agir?
Ou esperamos que o treinador (o editor da próxima entrevista) o ponha a jogar de início ou temos (os eleitores, os que sabem dos políticos pelos jornais, pelos media) que nos envolver de outra forma com a acção política, essa coisa nobre e apaixonante e tão mal amada que não vende jornais nem cria fortunas.
Bem vistas as coisas, na actual conjuntura não há alternativa.
Três vivas para a ajudinha que nos dá a BLOGOESFERA!