Lembram-se de António Vitorino se ter demitido a propósito de algumas notícias que o acusavam de ter escamoteado o pagamento de impostos sobre a propriedade?

Veio o provar-se que as notícias eram falsas, mas António Vitorino não esperou pelo desfecho da lenta justiça e demitiu-se.
O poder dos media, o poder do “parece” de que fala hoje o Abrupto fez então mais uma vítima. A meu ver, ainda que compreenda a posição do envolvido (sendo bem mais confortável assistir à limpeza da honra fora do foco das atenções em que ficaria enquanto membro do governo), julgo que acabou por não ser um bom exemplo para a democracia. Preferiria que tivesse sido mais “heróico”. Que exigisse, pela determinação, que se distinguisse o trigo do joio. Para mais na altura, apesar do que se escreveu, o “pareceâ€? nunca atingiu as dimensões de um caso Portas…
Sinceramente, não sei o que faria se fosse comigo, se teria estômago para combater a calunia dos jornais. Por isso a atitude de António Vitorino não pode merecer mais do que uma suave crítica. A culpa nesse caso ficou com quem acusou sem ter razão e o dano sobrou para todos nós. Mas, como disse, esse foi um exemplo das injustiças que a fogueira mediática pode trazer. Temos de ter o discernimento de avaliar cada situação, de averiguar os factos antes de lançar o fogo.

E avaliando cada situação, não vejo como JPP pode ter reservas em avaliar a questão de ontem a quente, em não emitir opinião definitiva por tudo ainda ser muito recente. Pergunto: o que falta ao processo para que todos possamos ficar instruídos sobre o assunto e deliberar a sentença política com segurança de esta ser justa e indispensável? Tudo foi confessado pelos intervenientes, não há mais matéria de facto a apurar, pelo menos em relação a Pedro Lynce.
Quanto a questão de grau, de ser uma pequena questão face aos procedimentos “modernos” admito que tenha toda a razão. Mas por ingorância – que não por inocência – esse tais procedimentos “modernos” não chegam às páginas dos jornais que leio logo não existem, logo vivo feliz e contente ao lado deles. Esse é outra questão do problema. Não é por a falsificação da qualidade da borracha dos pneus não ser detectada e punida que vou deixar de punir aquele que conduz embriagado.

E depois, o que acho mais grave, é que discutir o tom, querer enquadrar esta demissão num eventual histerismo mediático recente é no mínimo desonesto. É uma argumentação que partilha o mesmo tipo de raciocínio artificial e irreflectido que leva os media por vezes a libertar as lâminas das suas guilhotinas. Cada caso é um caso, e a eventual avidez demissionaria patente noutros recentes (questão dos incêndios por exemplo) não pode servir para englobar este outro como se fosse igual, produto de uma onda nefasta.
Essa é a desonestidade que adivinho (esperemos que mal) no que escreveu hoje José Pacheco Pereira.

Quanto aos procedimentos “modernos”, todos somos poucos para os condicionar. Enquanto cidadão conto com o Eurodeputado para exercer o melhor que puder o seu um pouco menos limitado poder para condicionar tais práticas. De qualquer forma, para já e para a minha vidinha, vou tentando, à minha pequena escala, combater as cunhas, os favorecimentos, o nepotismo e a hipocrisia.

A hipocrisia felizmente é uma mancha que podemos limpar pondo a mão na consciência e mudando de atitude. Não afastemos os hipócritas, denunciemo-los e chamemo-los à razão. Sejamos cristãos neste aspecto.
Rui MCB

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