“A União Bancária (ou melhor, o tímido esboço de União Bancária que se desenhava) afinal não vai entregar poderes decisórios sobre a resolução (falência apoiada) de bancos à Comissão Europeia mas deverá ser “internalizada” no conselho de ministros europeus das finanças ou num órgão similar mas formalmente diferente para não ferir os tratados. Em qualquer dos casos uma instância  há vários anos dominada diretamente, sem oposição relevante, pelo governo alemão. Estas alterações, além de ameaçarem atrasar todo o processo de constituição (por razões diversas, inclusive financeiras) chutando qualquer expectativa de operacionalização deste embrião de pilar da União Bancária para um tempo onde, provavelmente, já teremos outro episódio de crise em mãos, a “internalização” mata qualquer perspetiva de credibilização da eficácia de tal mecanismo e, a ser correta esta leitura, clarifica a incapacidade europeia em desenhar em tempo útil os pilares há muito identificados como indispensáveis para a sustentabilidade da zona monetária comum.

Esta decisão, ainda em afinamentos, terá sido acordada entre  a CDU/CDU e o SPD, resultando de um dos pontos de acordo que se desenha para a formação de um governo de coligação na Alemanha. Em conjunto garante-se que não haverá qualquer forma de mutualização da dívida ainda que se desenhe, paradoxalmente, uma qualquer forma de salário mínimo europeu – um instrumento cuja operacionalização é difícil de imaginar.
Com episódios destes é difícil ignorar o que parece cada vez mais óbvio. O desígnio nacional para gente de barba rija é cada vez mais concentrar neurónios a desenhar como sair do €uro (de preferência acompanhados) com o menor dano possível.
O resto é cada vez mais uma miragem ou a memória do que podia ter sido mas que não irá ser. É cada vez mais difícil manter a esperança de um qualquer tipo de volte-face decisivo. Não deixa de ser caricato que a melhoria relativa da situação de emergência financeira nos países da periferia seja apontada como razão para que não se tomem medidas mais substanciais. Sempre a eterna perspetiva de curtíssimo prazo a dominar o processo de decisão.

O risco maior será deixar apodrecer e deixar arrastar a situação de destruição das economias e das democracias até a um ponto de não retorno onde, perante a evidência da acumulação dos erros, já não haverá clarividência, discernimento e condições objetivas para se reagir da forma mais adequada.

Tudo pode ficar muito pior do que está e, neste momento, passando por cima da espuma dos indicadores económicos de curto prazo, tudo parece ir ficar muito pior do que está, sem qualquer tipo de almofada  institucional, económica ou política para acomodar qualquer futura gota de água que transborde o copo.
Nesta perspetiva macro, o que o nosso governo faz ou deixa de fazer na gestão de tesouraria local é pouco mais do que um grão de pó no universo daquilo que realmente importa.
Tudo o que possamos fazer poderá ser necessário mas nunca será suficiente para assegurar o bom governo e a sobrevivência a prazo do projeto europeu. E se ninguém percebe a música certa que é preciso dançar, todo o mundo vai dançar, mas na perpectiva brasileira do provérbio. É melhor cuidar de sair desta modinha desesperante em que estamos metidos. Como o fazer como o menor dano possível?”

Publicado originalmente no Economia & Finanças.

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