"Fui desencantar no meu arquivo um texto sobre MRP [Margarida Rebelo Pinto] que escrevi há três anos para meu divertimento e do meu círculo restrito de amigos. O ponto de partida é semelhante ao de J.P George: pegar nos livros de MRP sem ideias pré-concebidas. O resultado, esse, é diverso pois não tenho nem a sua experiência académica, nem o mesmo olhar.  Decidi desenterrá-lo e difundi-lo como forma de solidariedade pelo direito à crítica e à liberdade de expressão. Façam ao texto o que entenderem. Apesar de ser da minha única e exclusiva responsabilidade não tenho por ele sentimentos de paternidade.
Francisco Goulão
"

Segunda-feira publicar-se-á (sem edição especial) o artigo do Francisco Goulão na íntegra. Para já um excerto:

"(…)  É um facto! Caso ainda não tenham reparado Margarida, tal como a Toyota há quarenta anos, veio para ficar nas letras nacionais e ficou mesmo. A própria escritora admite que, para exprimir realidades e sentimentos, tem à mão “…este mundo difícil que é o das palavras” (III). Tão difícil é que Margarida recorre com abundância ao mundo mais acessível do palavrão. Neste recurso estilístico a “merda” apresenta-se como uma palavra de eleição. A “merda” é espalhada cuidadosamente nos seus textos. Seja na acção ou no resultado, no abstracto ou no concrecto a “merda” vem sempre carregada de sentidos, potenciado novos e inesperados contextos. É uma “merda” que, no fundo, é muitas vezes comum mas raramente singular.

 A merda polissémica

Cagou completamente em mim (II)

…o gajo está-se cagando para ela (II)

Estava só a pensar aqui numas merdas (IV)

…aquela merda que carregas no peito (V)

A minha vida é uma merda de um deserto (II)

Achas que eu aguentava uma merda destas? (V)

Há uma distinção clara entre a merda substantivada e as merdas indefinidas, de consistência quase abstracta, porém significativas, relativamente às quais ninguém deverá ficar indiferente. É esse o grande risco do mundo moderno: o alheamento, a alienação. Por isso a autora avisa cheia de lucidez numa frase paradoxal:“Não te cagues nessa merda!” (…)"

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