O Luís Tito no Tugir chama a atenção, e bem, para um risco de a iniciativa sugerida pelo Paulo Gorjão e amplificado pelo JPacheco Pereira se transformar num exercício demagógico de caça às bruxas, recordando:

” (…)identificar os casos de laços de parentesco na política.”

Em jeito de resposta sarcástica para expor o ridículo da sugestão, o Luís lança outro desafio:

“Que enviassem para tugir@mail.sitepac.pt dados sobre casos de licenciados que tenham laços de parentesco com outros licenciados, em especial se as licenciaturas forem nas mesmas disciplinas.”

Julgo entender muito bem que perante a nossa sociedade, tão useira e vezeira em chafurdar na intriga, egoísmo e nas vingançazinhas, este tipo de iniciativas são bastante arriscadas apesar das suas boas intenções. Afinal ser filho de alguém na política é algo intrinsecamente mau ou bom? Mas…

O mas é defeito de fabrico, ou por outras, curiosidade do estatístico. Acho sinceramente que este país e muitos dos nossos pecadilhos (acrescento a hipocrisia aos acima referidos, para não me alongar mais) se dão muito bem que a “transparência” localizada e muito mal com um eventual exercício sério que nos aproxime de um auto-retrato minimamente razoável. Só assim entendo o desprezo e desleixo pelo conhecimento estatístico de qualidade que a atenção pontual por um ou outro número mais politizado disfarça muito mal.
Sintetizando, acho que ambos os desafios, o do Paulo e mesmo o que foi apresentado com sarcasmo pelo Luís, são absolutamente razoáveis se inseridos num exercício global de conhecimento. A isto junto o facto de achar perfeitamente legítimo ter uma referência para a dúvida implícita no desafio do Paulo, acrescentando que não há uma normal com a qual confrontar os resultados do exercício a realizar a menos que já alguém tenha defenido o fugidio conceito de ‘senso comum’.

Quanto é muito em termos de ‘dinastização’ da política? Ou ao nível das academias? Ou da estatística? Ou da literatura? Ou do desporto (veja-se o futebol tão fértil neste campo)?
Junto a isto outro tipo de perguntas (serão mesmo outro tipo?) que poderiam abranger a “dinastização” no seio das famílias pobres, das profissões de trabalho não qualificado… Antes dos porquês ou dos juízos de valor temos de ter acesso ao número cru. Interessa? Sim, sem ele podemos limitar-nos a concluir, por exemplo, que os políticos são todos uma corja, protegem-se todos uns aos outros e (com o passar dos anos da democracia) são todos da mesma família! Se o Luís não ouvi já este discurso eu estou fartinho dele sem defesa ou informação para perceber ou… julgar.
Num país que tem vergonha de seguir os passos dos seus vizinhos assumindo e encarando, enquanto nação, os números mais básicos e absolutamente retratistas (bem longe do traçar perfis) sobre a pobreza, seria muito útil estudar o assunto de uma perspectiva histórica: na história de vida de várias gerações.

Recentrando a questão na política, perguntar é ser MacCartista, Luís? Pode sem dúvida ser, aliás pode ser sempre aquilo que quisermos. Mas terá sempre de ser? Só isso deveria descartar qualquer hipótese de pergunta. A alternativa, o não querer saber ou não poder perguntar, tem “riscos” igualmente execráveis, até pelo país que temos.
Talvez ainda não tenhamos aprendido a lidar com a informação (e em boa medida a produzir informação!). Esta é um brinquedo com o qual somos desastrados, mas a coberto disso vamos ‘emburrecendo’ cultivando a sensação de estarmos sob o olho atento de paizinhos semi-invisíveis (aparentes apenas perante algum acesso de pimenta ao nariz) que não visam sequer defender-nos de nós próprios.
O objectivo, a forma como o exercício seria (será) conduzido e a honestidade na apresentação dos resultados farão sempre toda a diferença, mas ter presente o risco e a perspectiva micro de tal desafio num universo macro de ignorância sobre os restantes ofícios terão de ser argumentos desbloqueadores de alguma forma de questionar, legitimando e enquadrando as perguntas e o tratamento das respostas.
Temos de começar por algum lado… Digo eu.

Concordo que haverá sempre o risco de se sublinhar o que temos de pior ou de melhor… mas a isto acrescento um “consolador”: para variar!
Dito isto convém também sublinhar que o exercício nos moldes em que é proposto não poderá ser muito ambicioso, como julgo ter ficado mais ou menos explícito no que o Paulo escreveu. Está longe de se aproximar do que convencionámos por minimamente razoável em termos estatísticos (quando pretendemos inferir grandes coisas), mas pode ser, pode até acontecer que esta conversa entre amigos sugestione outro tipo de trabalho como tantas e tantas vezes acontece.

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