Leitura no adufe para os próximos dias nas linhas que se seguem (o post é inadmissivelmente longo):


Tenho andado nos últimos tempos em atarefado estudo de mercado automóvel, na óptica de potencial comprador. E deu-me para engraçar com uma oferta da Peugeot, o 307. Trata-se de uma viatura em fim de ciclo, ou melhor, que vai ter um restyling algures durante o mês de Setembro em Portugal.
Nas minhas andanças para confirmar a hipótese do restyling – que desvaloriza imediatamente a série anterior – fui ter a França de onde saí a custo depois do brutal choque da diferença do peso do Estado junto do consumo. Por outras palavras, um 307 XS Premium 1.6i, que em Portugal, sem extras se chama 24.352,52 € em França, já na nova versão pós restyling, chama-se algo como 18.600 €. Quase 6000 mocas (pardon my french) num pequeno familiar. Uma diferença que diminui muito pouco se a opção recair por um 1.4, um carrinho um bocadinho mais em conta.
Tendo ido a um stand da marca (Lisboa, Av. da República) e ouvido a proposta do vendedor (qualquer coisa como 23.000,00 €), vendedor que, diga-se, disfarçou muito mal, mas tentou!, a existência de um restyling (as voltas que ele deu para se desculpar com as restrições à escolha de cores, opcionais e afins!) fui até Espanha onde o restyling ainda não se verificou, para me informar das diferenças de preço no mercado vizinho. Para os tais 24.352,52 € que se praticam em Portugal encontrei 17.759,99 € aos quais se subtraem ainda, em toda a rede de concessionário do país , 2.000,00€ relativos a uma promoção, a promoção com que contam conseguir escoar os stocks para receber o novo modelo. Ou seja, a mesma viatura, se tomar como comparação a primeira proposta do vendedor lisboeta e sem negociar nada com um vendedor espanhol fica mais barata em Espanha mais de 7.000,00€ (acumulando as diferenças de fiscalidade e a política da marca).
Numa penada ficam retratados dois dos nossos problemas crónicos, o do excessivo peso do Estado (sou apologista da substituição da fiscalidade no acto da compra pela tributação à utilização) e, por outro lado, um certo abuso, uma esperteza saloia ligada ao comércio, onde provavelmente fruto de uma atitude pouco combativa por parte dos consumidores, temos de nos confrontar com a lógica muito popular do “pela-cães” em quase tudo o que é negócio em que tenhamos de nos meter. As margens comerciais em Portugal por unidade vendida devem ser muito superiores às obtidas em Espanha e, provavelmente, o ganho que dai advém compensa as eventuais perdas na quantidade vendida. Será? Não sei dizer ao certo mas sei que a suspeita poderia recair sobre a compra de muitos outros produtos. Os nossos comerciantes conhecem muito bem as leis de mercado, já os consumidores… Tudo seria mais fácil se pudesse ir comprar um carro a Espanha, ou se tivéssemos um Estado mais enxuto e razoável, assim, se quiser os benefícios dos nossos vizinhos de aquém e além Pirinéus, destes nossos companheiros de União Económica, “Política” e Monetária, terei de votar com os pés, mudando-me para lá.

Eis como com esta insatisfação do dia-a-dia se complica ainda mais a tarefa de reduzir o défice e eis como o aperto pessoal dos calos estimula a crítica política.

Não é sustentável subir a fiscalidade e atirar uns planos para o ar à espera que o crescimento económico venha para tapar o sol com a peneira (por via do reforço da tributação fiscal) por mais uns anos. Aumentar a idade da reforma do regime geral tomada como medida emblema é, neste sentido, equivalente a aumentar os impostos: estaremos adiar a insustentabilidade do sistema por mais uns anos e pouco mais do que isso. O essencial manter-se-á oculto sob o paleativo amargo (se não amargar não é bom remédio).
O tempo ganho com o acrescido sacrifício fiscal deve ser exactamente para se garantir não só a reversão da situação fiscal, mas também e principalmente uma estrutura de Estado sustentável: o seu aparelho e o país que o governa e que dele se quer governar.
É fuldamental e urgente que o PS, partido com maioria absoluta, não perca esta oportunidade histórica para condicionar da melhor maneira possível qual quer que seja o papel do Estado na nossa economia.
Outros o farão de forma drástica e muito pouco consentânea com o ideário moderado de um social-democrata. Preferiria que essas dificies escolhas (que poderão passar por escolhas entre medidas assustadoras como reduzir drasticamene as pensões de reforma e outras transferências socias de forma tendendialmente transversal / despedir funcionários públicos / reduzir o aparelho político do Estado – câmaras, freguesias, governos civis, parlamento – / privatizar boa parte do sistema educativo / eliminar todo o tipo de monopólios autorizados pelo Estado / reduzir a complexidade da tributação fiscal a quase zero / etc, etc, etc, etc, etc, etc) fossem enfrentadas e desencadeadas pelo PS mediante as difíceis escolha gradativas que implicariam. Gostaria de ter alguém da minha área política com quem pudesse eneteder e discutir os caminhos mais razoáveis para essa nova ideia de Estado Social, mas por estas bandas predomina o ermo, fazem-se continhas de autarquiazinhas, cozinham-se candidaturass ao nível micro sem olhar a critérios decentes apenas com o fito de chegar a um número final gosdinho relativa a uma realidade alternativa.

O que vejo em termos de discussão do papel do Estado é algo muito suave, difuso. Ninguém no governo ou fora dele (na oposição) tem coragem para lançar estes temas para a praça pública, apenas um ou outro economista se tem atrevido a lançar uns petardos que outros tratam de garantir que não passem de pólvora seca. Apenas uma ou outra boca de António Costa fazem adivinhar que pode haver vida desta discussão para além das Autárquicas. De novo se cultivará a sensação de engano? Bendito o artigo do Ministro das Finanças que veio despejar mais água fria na ideia que a receita milagrosa já está passada. Deixar cultivar a ideia de que no dia 10 de Outubro é que é, não somará um voto ao PS, o governo tem de continuar a demonstrar que está a fazer o melhor que sabe, só assim poderá não perder a credebilidade que tem ameaçada desde o dia em que justificou a quebra de promessas chave.

Também aqui, nas finanças públicas, a situação caminha para uma deterioração de tal ordem que teremos de ter uma pega do boi como alguém escrevi nos comentário do Adufe há dois post atrás: uma situação em que não haverá possibilidade de optar, de matizar as reformas, apenas nos restarão as soluções drásticas como quem resolve todos os problemas energéticos com o gral do Nuclear, ou como quem vai colocar Portugal no Sécullo XXI com um Aeroporto ou um combóio que “têm de ser”. Ou como quem resolve as contas desequilibradas com mais um furo no cinto ou menos um ano de reforma. Ande está o grande plano onde tudo isto pode fazer sentido? Onde está o grande plano onde podemos ver a luz ao fundoo do túnel em que nos enterramos cada vez mais a cada dia que passa?

E tudo isto, dirá o caro leitor, porque se não ganho o mesmo que um espanhol médio, quero ao menos que o meu carro tenha um valor nominal igual ao dele. Talvez. É que neste e noutros casos, o tradicional “a culpa é do governo” não é mentira. O chato é que só emigrando deixo de fazer parte deste governo. O verdadeiro fado é que eu gosto deste torrão.

Haverá ideias no governo para este país? Ser de esquerda não nos dá o direito à estupidez na defesa da situação de curto prazo, não nos dá direito a fazer de conta que o papel do Estado não tem de ser alterado, não nos dá direito à cegueira que nos oferece uma vida de dedicação ao partido. A asfixia é global e transversal a ricos e pobres. E a manutenção das mezinhas do costume farão sofrer ainda mais, a prazo, os mesmos do costume. A caminho de futuro da esquerda é tudo menos linear, mas tem de ser caminhado, a bem da nação e da igualdade, liberdade e fraternidade dos cidadãos.
Gostava que a esquerda encontrasse um sentido. Se a malta de direita fizer o seu trabalho de casa ainda combinamos uma festa do caraças, um dia destes.

Nota: Perdoem-me desde já o erros ortográficos particularmente profícuos a estas horas da matina. As correcções seguir-se-ão a uma noite bem dormida.

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