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Os moralistas têm vida curta entre nós; não só são gente de mau aspecto como se trata de pessoas cheias de inveja. Os portugueses são sarcásticos, quando se trata de moral – de Gil Vicente a Eça, há uma larga tradição de textos sobre o assunto, mostrando que a moral é matéria para consumo estritamente privado. Na verdade, padres, juízes, beatas envilecidas, fuinhas de toda a espécie, são pouco populares entre nós. É uma vantagem enorme que temos de agradecer ao destino. As pessoas sabem que há uma vida privada e que há uma vida pública; e sabem que, desde que a vida privada não assalte a vida pública, podem dormir descansadas. Os portugueses não apenas sabem isso, como também, porque são manhosos, percebem que a tentativa de moralizar não lhes vai ser útil nem agradável. Os portugueses gostam de desafiar a moral. E apreciam os gestos de gente livre e que não admite interferências do juízo moral dominante.
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O que os portugueses não gostam é que, em matéria de costumes, se apregoe uma coisa e se faça outra (como acontecia nos textos de Gil Vicente). As insinuações morais são sempre ridículas, cretinas e impopulares.
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Francisco José Viegas – Jornal de Notícias

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