O Paulo (Bloguítica) expressou uma justa indignação perante as declarações de hoje de José Sócrates onde este afirmou não ir reverter, durante 2005, a situação anterior ao Orçamento de Estado em vigor, em termos de benefícios fiscais (e julgo que manterá igualmente a redução do IRS já orçamentada, se bem percebi).
Se Sócrates prometeu, no passado, retomar a situação (pelo menos votou negativamente o Orçamento), a decisão expressa hoje é custosa, sem dúvida. Mais a mais estando em plena campanha. Mas…

Sem querer estar a exaltar (demasiado) a honestidade da divulgação deste propósito de não recuperar os benefícios fiscais on the double ainda durante a campanha – que diferença para exemplos do passado recente Barrosista, não achas Paulo? – apelo a um outro argumento que tenho utilizado para tentar conciliar esta atitude com a “oferta” política do PS de Sócrates que se vai desenhando paulatinamente.
Tomo por razoável que nem tudo o que foi feito em três anos de governação da coligação PPD-PSD/CDS-PP que mereceu a nega da oposição e, particularmente, do PS poderá (e a meu ver deverá) ser revertido. Esta parece-me ser uma realidade incontornável em qualquer mudança de governo. Mas a reversa também é verdadeira: nem tudo poderá permanecer como estava. Resta então esclarecer o povo sobre o que fica e o que vale a pena alterar.
A mim parece-me saudável e desejável que o PS faça esse esclarecimento antes de irmos a votos. Seria absolutamente imperdoavel o PS manter o silêncio ou a ambiguidade até ao dia das eleições para depois dizer o que se disse hoje. O sentido higiénico do exercício da política que daqui tranparece merece um significativo reconhecimento e aplauso.

Dito isto choca-me a ausência de valor acrescentado nas declarações, talvez mesmo alguma ausência de tacto político. Explicando: teria sido muito mais fácil aceitar esta decisão se Sócrates complementasse a manutenção do fim dos benefícios fiscais ao dispor da classe média com algumas medidas concretas de ataque a tantos e tamanhos outros benefícios não dirigidos à classe média, ou seja, se fizesse aquilo que Bagão Felix não fez quando concretizou em lei a medida.
Sócrates ainda tem capital de credibilidade para se poder atrever a pedir que acreditem que é essa a sua intenção: simplificar o sistema fiscal de forma não enviesada, ou seja, não se centrando em penalizar a classe média.

Sócrates é cauteloso e tenta manter disponíveis as suas opções afirmativas onde outros prometeram e mentiram descaradamente, mas devidamente embrulhada esta continuidade parcelar de política poderia ser tragável por mais gente. Um cheirinho de complemento à manutenção do status quo fiscal com indicações sobre as iniciativas socialistas seria recomendável mas se calhar teria sido incómodo para alguns membros da plateia para a qual Sócrates hoje falou… Este eventual sinal é que me preocupa verdadeiramente. Dizer que se vai tomar uma atitude absolutamente cautelosa por desconhecer a dimensão do monstro também me custa a engolir para quem deixou o governo há três anos.
Feito o elogio e sublinhado o sentido de responsabilidade fica o apelo ao risco político. Esclarecido o que permanece digam-nos onde e se teremos “socialismo moderno”. Quem não arrisca…
E depois há as boas cunhas que convém ir ouvindo.

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