Desculpem o título, mas segue resposta a algumas perguntas aqui deixadas pelo leitor Luís S. ainda a propósito da questão do dumping.

«Como determina o que é uma acção continuada de dumping (numa grande superfície ou noutra empresa)?»

Determino por aquela que eu estiver disposto a admitir como disruptora da concorrência pela inovação, capacidade de gestão e de produtividade dos concorrentes de um determinado mercado.
Proíbe-se a venda abaixo do custo se ele persistir no tempo e tiver um impacto na concorrência de tal forma que for conduzindo a uma tendencial situação de monopólio. Haverá situações de identificação mais simples e outras mais complexas. A própria avaliação do estágio de desenvolvimento concorrencial de cada mercado sectorial deverá ser considerada na definição e identificação de práticas de dumping prejudiciais para a concorrência. A definição terá de ser normativa e basear-se nestas linhas orientadoras e o recursos à jurisprudência que se for construindo parece-me um bom princípio de funcionamento.
Dois exemplos:
1º – peguemos em duas lojas vizinhas (para o efeito é irrelevante a dimensão ou o que vende, podem até ser prestadores de serviços). Uma vende os produtos com uma margem de 1% sobe o custo. A outra oferece os produtos a custo zero. Ao fim de dois meses a primeira fecha as portas porque não vendeu sequer uma caixa de fósforos e deixou de conseguir cumprir com os seus compromissos (pagamento da renda, consumíveis, etc). Se os consumidores fossem racionais saberiam que este seria o desfecho e saberiam também que muito provavelmente no dia em que uma das empresas falisse a outra aumentaria os preços… Contudo, a empresa faliu mesmo pois todos ficaram à espera que o vizinho fosse lá comprar a pagantes enquanto eles levavam o que queriam de borla na loja ao lado. A loja da margem de lucro a 1% foi vítima de uma acção continuada de dumping (que durou apenas dois meses). No final, os preços aumentaram e os consumidores perderam. Não me perece que fosse impossível identificar esta situação com alguma antecedência após a denúncia da empresa em risco de ruína.
2º – Um hipermercado todos os dias pratica dumping sobre um produto diferente. Neste caso a prova das consequências nefastas sobre o mercado que referi pura e simplesmente não se conseguem provar. A abrangência, duração e severidade da prática tem efeitos que se diluem no mercado. Do ponto de vista do consumidor esta situação traduz-se num ganho e não numa perda.

«Se se criam barreiras, ao estabelecimento e livre gestão de novas lojas ou unidades produtoras, por decreto ou lei, como pretende garantir o livre acesso de investidores a esse mercado, evitando assim o que chama de “concentrações sucessivas da capacidade produtiva/quota de mercado”?»

Mas essa é outra questão caro Luís. Um dos exemplos mais gritantes de condicionamento legal à entrada que considero completamente anacrónico é a situação das farmácias como já destaquei no Adufe. Não conheço exaustivamente todos os casos de limitações à entrada por imposição legal, mas por princípio sou contra. As limitações de que fala são sem dúvida um forte contributo para as concentrações mas há outros e nem todos necessariamente maus pois não creio que por definição uma concentração seja má para o mercado (e para os consumidores).

«Porque é que a “sustentabilidade das empresas estabelecidas” deve ser um objectivo? Deverão ser sustentadas mesmo nos casos em que estas são ineficientes, inclusive em situações de monopólio administrativo?»

Falo em sustentabilidade dentro das regras de livre e leal concorrência respeitadora das normas de conduta estabelecidas a cada momento pela sociedade em que se inserem. Era apenas e só isto que queria dizer. Não é sustentável (para um mercado saudável) uma empresa vender produtos abaixo do preço de custo (nos moldes do 1º exemplo lá de cima) e não deve ser permitido se isso tiver como principal motivação a ruína dos concorrente numa lógica de pocker onde o objectivo é não deixar o adversário ir a jogo, em vez de permitir que todos paguem para ver.

Cumprimentos

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