Com grande regularidade o editorial do Jornal de Negócio ganha a minha preferência quando me posso dedicar a leituras da imprensa. Umas vezes Sérgio Figueiredo outras Paulo Ferreira, oferecem-nos um exercício de referência na imprensa portuguesa que espero sinceramente venha a fazer escola particularmente nestes tempos de desilusão com antigos exemplos de jornalismo completo e incisivo. Mais do que nunca fazem-nos falta órgãos de comunicação social feitos por quem tenha brio na sua isenção, que prime pela exigência e auto-crítica, que tenham na comunicação entre representantes e representados o seu móbil principal, que se guiem pela procura da verdade e que façam da honestidade e competência da análise os seus instrumentos de trabalho.

Hoje coube a Paulo Ferreira assinar um editorial que nos oferece à consideração um dos exemplos mais caricatos e chocantes do imobilismo e incapacidade política dos principais partidos portugueses. Refere-se à questão do governo das Farmácias no editorial “Farmácias Douradasâ€?:

«Qualquer cidadão suficientemente idóneo e capitalizado pode tornar-se proprietário de uma clínica médica ou de um laboratório de análises, de um hipermercado ou de um banco, de uma gasolineira ou de uma escola privada. O que não pode, porque a lei não o permite, é ser dono de uma farmácia. A menos que, e essa é a restrição legal, tenha uma licenciatura em farmácia. Atenção que estamos a falar da propriedade do estabelecimento e não da sua direcção técnica. Esta sim, deve exigir as devidas credenciais, como qualquer pessoa de bom senso defenderá.
A reserva da propriedade das farmácias para os farmacêuticos tem cunho salazarista e data de 1965. E nos 30 anos que já levamos de democracia e de abertura dos mercados ainda não houve uma vontade com força para derrubar esta coutada.(…)»

Vale a pena passar pelo link para uma leitura completa. Só posso lamentar que em sucessivas entrevistas feitas a Ferro Rodrigues, Durão Barroso e outros lugares tenentes destes partidos, as perguntas implícitas e explícitas neste editorial e em tantos outros fiquem quase sempre por fazer e se destaque sistematicamente a pequena intriga, o nome, o sucessor. Mais do que reflexo dos políticos essas entrevistas são reflexo dos jornalistas que as fazem, da sua (falta) de formação e liberdade.

Alguma imprensa vai felizmente estabelecendo fasquias elevadas que inevitavelmente só a enobrecem e enriquecendo o país e a nossa democracia. É por aqui o caminho. A imprensa pode dar um contributo muito relevante para melhorar a nossa democracia e pode condicionar positivamente o tipo de políticos e de eleitores que viremos a ter no futuro.

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