O que está a falhar nas inspecções de veículos?
Este fim de semana disseram-nos que poderá andar mais de um milhão de veículos com inspecções obrigatórias feitas mas indevidamente aprovadas.

Disseram-nos que o elo mais fraco são os inspectores por estes serem trabalhadores como os outros. Ou seja, por poderem ser trabalhadores a prazo, com contratos precários e/ou cada vez mais facilmente dispensáveis graças às maiores facilidades de despedimentos presentes no novo código de trabalho. Pessoal mal formado e/ou mal alimentado, gerido por patrões que lhes impõem o crime como condição de emprego (espero que seja crime!).

Mas são o elo mais fraco do quê? Dos interesses em jogo, evidentemente.
O interesse do cliente, particularmente quando é dono de uma grande frota de veículos comerciais (ligeiros ou pesados) que escolhem o centro de inspecções, não de acordo com o preço, que é fixo, mas de acordo com a maior ou menor probabilidade de um mesmo veículo ser aprovado ou reprovado na inspecção. E o interesse do dono do centro.

O dono do centro de inspecção deveria agir no respeito do alvará do Estado. Deveria prestar serviços ao Estado cumprindo as suas obrigações… Mas o dono do centro de inspecção não é do Estado, é um privado com privados interesses que, não podendo fixar preços, continua a ter preocupações de viabilidade financeira do seu centro, continua a ter de pagar maquinarias e trabalhadores, continua a querer o seu lucro, a sua remuneração do risco em que incorre e do investimento feito. Acresce que o dono do centro é por vezes (aparentemente muitas vezes) alguém com uma muito privada concepção de direitos e deveres cívicos.

Todo o edifício se desmorona, já pela segunda vez com repercussões públicas – sim a notícia não é nova se tiverem memória…

O que fazer?
Inspeccionar mais os centros de inspecção?
Interiorizar no aparelho do Estado a fiscalização dos veículos?

Como disse a notícia não é nova e as medidas anteriormente tomadas (que levaram a alguma concentração dos centros de inspecção) não parecem ter garantido os resultados desejados.

Tudo isto era tão previsível quando surgiram pela primeira vez os centros de inspecção técnica de veículos… A iniciativa privada, particularmente em situações de mitigação das regras de mercado – que julgo serem incontornáveis neste caso – tende a produzir estes efeitos se não for regulada. O equilíbrio exige uma intervenção activa e permanente do Estado, uma ideia que tantas vezes é iludida pela “privatização” de serviços.

A continuar a ser este o cenário mais previsível sempre que o Estado delega o provimento de bens públicos na iniciativa privada, saberemos que privatizar será também sempre um grave erro. A pior solução.
Neste caso de consequências criminosas. Como noutros.

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